Como será constituído o Cérebro de um Hiper-Liberal?

“Sei que não sou o Damásio nem sequer o Descartes, mas, penetrarei nos recônditos âmagos do estudo do cérebro e das suas funções, tentando compreender o processo cognitivo e neurológico de um simples actor neo-liberal (neste caso a versão extremista em voga, o Hiper-liberalismo). Imaginem então, um cérebro de um Camilo Lourenço, de um Luís Delgado ou de um Ministro das Finanças como o nosso”.

Silêncio…gráficos a brilhar em ecrãs de três dimensões. Dígitos contabilizando as subidas de crédito ao som repetitivo e sugestivo de máquinas de contar notas. Tabelas, quadros, balanços, a mostrarem a disparidade entre activos, passivos, cash flows, índices de performance e rentabilidade, numa cacofonia de números, tilintares de moedas e restolhar de papel monetário que facilmente possuem o espírito vazio do mais fraco, básico e comum dos mortais. Ah…o que uma educação publica inexistente ou de baixa qualidade poderia ajudar…O dinheiro que ganharíamos. Pensam, suspirando e sentido a pulsação cardíaca a aumentar, todos os Passos Coelhos deste mundo.

Beleza? Arte? Sublimação? Transcendência? Interioridade? Profundidade? Subjectividade? Simplicidade? Emoção? Não, estes não são atributos de um mundo racionalizado por esta gente…Substituamo-los por: Eficácia; Eficiência; Objectividade; Superficialidade; Insensibilidade; Crueza; Quantificação…

Acabámos de entrar no cérebro de um “Investidor de capitais”. Foi difícil de encontrá-lo por entre o emaranhado de fios e circuitos integrados que levam a processos binários, que por sua vez estão ligados a uma centralina operada a distância, cujo IP não nos foi possível de detectar por se encontrar num qualquer paraíso fiscal.

Após ultrapassar-mos  a rede de pastas e ficheiros que fazem dele um verdadeiro e excelentemente programado Sacerdote da Nova Ordem Hiper Liberal Imperial, procurámos resquícios neurónicos e circuitos neuro-biológicos que nos ligassem, o seu pensamento artificial e anacrónico, ao que chamamos de reminiscências do nosso passado colectivo e de todas as referências culturais e históricas da nossa humanidade. Tentámos encontrar a sua consciência social, cívica e humana. Assim o encontraram vocês? Assim o encontrei eu!

Infelizmente, constatámos que as mesmas, simplesmente, foram apagadas, nuns casos, e secundarizadas, noutro. Regra geral ficaria contente com tal evolução tecnológica, mas, mais uma vez, a máquina em causa não foi criada para nos servir, mas antes, para nos submeter (deve ser da programação, afinal, MIT, Harvard, Oxford, Chicago a programarem esta malta…esperavam o quê?).

Para este cérebro, tão profundamente programado e incorporado de tecnologias biónicas e cibernéticas, não existe Adão ou Eva, grande arquitecto ou evolucionismo, creacionismo ou materialismo. Neste cérebro, podem caber todas estas concepções, porque todas elas, individual ou colectivamente, estão submetidas a princípios de programação superiores: O Principio Economicista; O principio da Competitividade crescente; O principio da Riqueza crescente; O principio da Acumulação constante. George Orwel escreveria o 2012 e não o 1984.


As referências culturais tradicionais mais não são do que pequenos ficheiros, que apenas são chamados ao processamento central quando se pretende vender alguma coisa ou ideia, que por sua vez, está submetida aos princípios estruturais acima referidos. Ou seja, este cérebro não é capaz de inovar ou de se revoltar. Todo o seu funcionamento é gerido em torno dos princípios expostos, informadores de toda a acção e reacção.

Neste cérebro, que tanto tem de evoluído tecnológica e cientificamente, quanto tem de medieval e obscurantista, não vale a pena falar de humanismos renascentistas ou de movimentos operários libertários. Não vale a pena falar de justiça social, simplesmente porque o social não conta. Não contanto o social, a justiça…deixa de ser a dos homens, para passar a ser a do dinheiro. Não vale a pena falar de fascismo, porque o inimigo está do outro lado. Com o fascismo enriquece-se muito…concentra-se muito…. Ah! E não tem de se utilizar aquele truque chato e instável da democracia e diálogo social (que alguns sujeitos muito aborrecidos insistem em utilizá-lo para a luta de classes).

O inimigo deste cérebro, está do lado do humanismo que defende que acima de tudo deve estar ser humano e a sua humanidade. O inimigo, está na ausência de classe explorável, na ausência de propriedade privada e na organização de um estado que trate as pessoas como…pessoas. O inimigo está no social, e em todas as correntes politicas que fazem do social o aspecto mais importante na nossa vivência humana. O inimigo está no socialismo. Este é o seu diabo. Quando aparece um socialista ou comunista, este cérebro começa por assinalar um alarme interior. Depois de colocar o seu portador (investidores e actores hiper-laborais) a debitar um sem número de preconceitos padrão, chavões e ideias feitas, ligando-se em rede, a todos os canais de comunicação social corporativa que passam a mensagem até à exaustão, o cérebro faz shut down e fica em hibernação, esperando que a discussão acabe e a paz-social volte rapidamente, pois o conflito social coloca em causa o Sacro Imperador “Mercado de Capitais”.

Ora, este cérebro em que entrámos, é um cérebro sem cara. É um cérebro sem identidade. É um cérebro autómato e telecomandado, cada vez menos humano, esgotando toda a sua existência na consagração e sublimação de um Estado Hiper-liberal, estado esse que pouco tem de institucional e nacional, tendo muito de transnacional, supranacional e imperial. Império sem imperador conhecido, império sem cara. Explora-nos, submete-nos, censura-nos, desumaniza-nos, mas, dificilmente identificamos de onde vem essa força que tem tanto de totalitária como de subliminar. De insidiosa como de intolerável. De intensa como de extensa. Não tem cara, tem muitas caras.

Este cérebro é um actor e contrata actores, marionetas que nos colocam à frente para que, as oiçamos ou as elejamos como supostos representantes. Actuam como programas informáticos que, quando os compramos, resolvem tudo e depois, apanham vírus e dão-nos cabo do computador.

Num cérebro destes, moeda, título, acção, lucro, rentabilidade, mais-valia, etc., constituem o cimento da existência humana, à qual a sociedade se deve submeter. O cérebro de um “investidor” prossecutor da teologia do “Mercado de Capitais” todas as energias populares se devem dirigir para a sublimação da Santa Riqueza Concentrada.

Se a sociedade conseguir resistir…mal o dela J. Invade-se, mata-se, mente-se, manipula-se, defrauda-se, ameaça-se e chantageia-se. Nenhuma vida humana vale mais do que uma bolsa recheada de “capitais”.

“Ave, mercado, ave. Santificado seja o seu Investidor. Abençoado seja o teu actor que nos garante a exploração crescente de mais valias, fazendo das pessoas capital, fazendo dos humanos, recursos. Ámen” in, Evangelho segundo o Nova Ordem Hiper Liberal Imperial



P.s. Como sabemos, o problema não é o radicalismo (nada de mal em defender radicalmente os nossos princípios). O problema é o extremismo. Seja ele qual for. 

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