há mais de 2000 anos já se sabia!

Cuidado! Vê o que acontece se não participares. Já Platão o sabia. Quantos mais milhares de anos serão necessários para tu também o saberes?

A injusta repartição da riqueza!

Consideras justa esta repartição da riqueza? Então o que esperas para reinvindicares uma mais justa? alguém que o faça por ti? Espera sentado/a!

Não sejas mais um frustrado/a!

Não há pior frustração do que a que resulta da sensação de que não fizemos tudo o que podiamos!

Suportes Tecnológicos




Tornou-se costumeiro dizer-se, alguns com mais razão, outros com menos e outros ainda sem nenhuma, que quando algum dirigente ou porta-voz do PCP usa da palavra para comentar algum facto político ou transmitir uma ideia ou opinião relativa a qualquer matéria política, está a reproduzir a cassete do costume. Isto com o objectivo de aludir-se a um certo discurso considerado datado, ultrapassado e amiúde repetido por todos os membros desse partido, como se, só houvesse um leitor e uma só cassete, perfeitamente enquadrável num certo carácter franciscano do partido. A existência da K7 também previne dissidências, descarrilamentos ideológicos e delitos de opinião de qualquer espécie.

Não vou aqui fazer qualquer juízo de valor sobre a validade dessa rotulagem, contudo, tenho a certeza de que, transpondo o discurso político partidário Português para os vários suportes tecnológicos de registo que conhecemos, o PCP não será o único partido do nosso quadrante, relativamente ao qual será possível esse tipo de correlação.

Vejamos então a minha proposta de transposição:


PCP – já sabemos! É a cassete (K7), pelos motivos anteriormente expostos

Bloco de Esquerda – É o MP3. Porquê? Porque, tal como o MP3, estamos perante um registo facilmente transmissível, copiável e universalmente reprodutível, cuja reprodução não importa a assunção de um compromisso mais ou menos rígido, tal como para se reproduzir um MP3 não se necessita de um suporte tecnológico por aí além. Tal como o MP3, o registo do BE é light, acessível, agradável ao ouvido, mas com conteúdo e substância de qualidade desejável, comparável à pouca profundidade e sustentação ideológica do discurso do BE. Daí o ocupar tão pouco espaço, o que é óptimo para os meios de comunicação social.

PS – Pend Drive! Uma Pen Drive? Mas uma pen drive não é um suporte de registo, é um suporte de armazenamento! Pois é! Mas tal como o PS, a Pen Drive pode armazenar todo o tipo de suportes que se desejar. MP3 para a ala esquerda, comparando-se por vezes ao BE. Folha de Cálculo para os liberais, porque tudo o que conta são os números. Word para os carreiristas da política que nos vendem a banha da cobra através de um discurso bonito e muito bem escrito. Wma e Mp4 para os corruptos, tal como os piratas que vendem vídeos e Cd’s áudio na feira. Na Pen Drive tudo cabe, tal como no PS também cabem todos os que quiserem lá estar. Fácil de guardar, de utilização universal, fácil de transportar e fácil de comprar, é tão fácil possuir uma Pen Drive quanto ser do PS.

PSD – o velhinho Disco cerâmico. Tal como o Disco das grafonolas, também o discurso do PSD é roufenho, soa a velho e ultrapassado. Tal como o Disco das grafonolas desapareceu por falta de capacidade competitiva com os “novos” suportes, também o PSD se deixou ultrapassar pelo PS, pois o PS regista o som do PSD, mas o PSD não armazena a informação da Pen Drive socialista. A estratégia está ultrapassada, a qualidade do discurso está ultrapassado pelas “novas” versões concorrentes ao centro e mais à direita. Tal como a sua líder, o suporte tecnológico associável ao PSD só tem lugar nos museus, cemitérios, casas particulares e nalgumas discotecas por onde circula o Santana Lopes. Até o Durão e o Cavaco já usam Pen Drive.

CDS-PP – CD-ROM Interactivo. Tal como nos CD-ROM Interactivos é sempre possível ao seu utilizador chegar ao fim, porque todos os caminhos possíveis e disponíveis lá chegam, também para o CDS todos os caminhos possíveis e disponíveis permitem chegar ao poder. Se for preciso utiliza-se a Pen-Drive para guardar o conteúdo do CD e diz-se que é do Centro e potencia-se uma coligação com o PS, por outro lado o CD-ROM também pode reproduzir o som da grafonola, e assim ocupa-se o espaço do PSD e chega-se ao poder pela AD ou pela coligação com o PS, por fim, por vezes o CD-ROM até contém MP3, para que se possam roubar alguns votos ou enganar alguns incautos, como nas feiras, mercados e outros espaços deste tipo. Cassetes, essas é que nem vê-las, aqui está o arqui-inimigo do CD-ROM. Ele convive com o Vinil, com o MP3 e com a Pen Drive, mas com a K7 é que nem pensar. Este CD-ROM interactivo é pedagogicamente fácil de utilizar e explorar, tanto pode ser explorado por um taxista, peixeira ou vendedor ambulante, como por um Salazarista, Capitalista ou até por Nazis. Desde a instalação no computador até à conclusão do percurso, todos os caminhos, estratégias, golpes e escolhas são possíveis, o que importa é chegar ao fim!

Como vêem, o nosso espectro partidário é tão rico quanto as formas de registo de informação. Embora o registo possa assumir diversas facetas, ele não varia de conteúdo muito por aí além, aliás, o estado do país é prova disso mesmo.

Pode ser que agora com o Blue-Ray ou com os ficheiros FLAC isto mudo,d esde que seja, claro está, em Open-Source, senão não saímos disto.

Um bom Natal e Um feliz Ano Novo e que recebam muitas K7’s Pen’s, CD’s e Discos, mas não piratas, claro está, dos verdadeiros. MP3? Se tivermos os outros para o que é que queremos um MP3? Porque é leve! Pois é, já me esquecia, até num telemóvel cabe.

Hugo Dionísio
Portugal está a evoluir!



Tempos houveram, não muito longínquos, em que o orgulho e o ex-libris do consumismo nacional se situava na praça do comércio. Patrocinada pelo BCP, SIC e outros ícones do nacional ilusionismo mercantilista, a árvore de Natal que se situava na praça do comércio e agora no parque Eduardo VII, era uma das maiores do mundo. O que interessa isso? Interessa e muito! A importância desse hodierno monumento é muito maior do que os seus largos centímetros de altura fariam antever.

Se a árvore de natal algum significado tem, não é, com certeza, o da necessidade de protecção e admiração pelas árvores nossas amigas, ou pela natureza em geral. Muito pelo contrário, como o provaram os emissários deste sistema económico feudal em que vivemos na recente conferência de Copenhaga. Esses senhores governantes, pretensamente eleitos e representantes da humanidade que os elege, principalmente aqueles que maiores responsabilidades têm no processo (alegadamente os do ocidente, terra da “democracia”) agiram, não nos superiores interesses de quem os elege, mas nos ainda mais superiores interesses de quem não os elegendo, neles deposita a confiança para a manutenção de um determinado status quo avesso à nossa sobrevivência. A partir do momento em que se deixou entrar o dinheiro na democracia, passamos a ter uma capitalocracia, ou seja, quanto mais dinheiro se tem, mais se manda, nem que isso leve à condenação do planeta e de todas as formas de vida, incluindo as suas.

Não! O significado da utilização do pinheiro como árvore de natal, nada tem a ver com isto. O seu significado, para além de questões meramente estéticas despidas de conteúdo, como tudo neste mundo de espelhos disformes, é o da ilusão de que no natal todos podem ter tudo. No natal todos podem sonhar em ter tudo. No natal os sonhos podem tornar-se realidade, podem materializar-se. Neste natal, ilusionista e mercantilista, há muito que valores simbólicos como o amor pelo próximo, a necessidade de nos preocuparmos com os outros ou a necessidade de vivermos todos em comunhão, em família, passaram à história. Hoje em dia, na sociedade pós industrial, o natal representa algo muito mais palpável. Representa o materialismo bacoco dos nossos tempos. No Natal há dinheiro para comprar, o pior vem depois.

Se há algo que podemos comparar ao tamanho das árvores de Natal, é a dimensão da ilusão da posse. Os países que maiores árvores de Natal têm são o Brasil (84 metros) e o México (90 metros). Emblemático, não?

Nos tempos que correm, a ilusão portuguesa só chega para 44 metrozitos de sonho. Se isto reflecte que estamos menos sonhadores que os brasileiros e os mexicanos, então, algo está a mudar e para melhor. Veremos no futuro.

Então mas porque é que no Brasil e no México, em tempos de aguda crise mercantilista, a ilusão da posse continua a ser tão grande? Querem que vos diga? Eu digo. Porque nesses países, onde a pobreza é tanta, onde a distribuição da riqueza é tão injusta, só lhes resta mesmo a ilusão de que um dia poderão ter algo. E como há uma grande percentagem da população com essa ilusão, as árvores são enormes. O tamanho da árvore é directamente proporcional à distância entre o que a população tem e o que queria ter. Isto é como a fonte dos desejos, quanto maior a moeda, maior o desejo, maior o prejuízo, menor a recompensa. É o sonho antes de acordar. Esses países ainda não acordaram.

Aliás, esta proporcionalidade ilusória funciona assim para tudo o resto. No fundo, a dimensão da árvore reflecte a desproporcionalidade entre o querer ter e o nunca vir a ter. E como essa desproporcionalidade é inultrapassável nas condições sistémicas actuais, a árvore não representa mais do que o tamanho da ilusão. Esta ilusão é, também ela, transportável para outros aspectos das nossas vidas:

• Um tipo pequenote, como os emigrantes portugas dos anos 60 e 70, que chegavam a França, ou outro país qualquer, e a primeira coisa que faziam era comprar um carro enorme. Lá está, o tamanho do carro representa a dimensão da desproporção entre a altura que se tem e aquela que se queria ter. Lá dentro, a ilusão de que se é grande é enorme, desde que só se olhe para fora e para os outros. Se o fulano olhar para dentro do carro, fica ainda mais frustrado.

• Um velho que arranja uma miúda nova. Nada melhor. A diferença de idades representa a diferença entre a idade que se tem e a que se queria ter. Quanto mais velho, mais nova a rapariga. Depois, andam tanto, que chegam a pedófilos.

• Uma velha que faz plásticas para parecer mais nova. Esta é a que eu chamo de ilusão inversa, ou melhor, a ilusão pura. É que, normalmente, devido ao ridículo do exagero, quanto mais plásticas fazem, mais inverso é o efeito. Quanto mais novas querem parecer, mais velhas ficam. A diferença entre o que são e o que tentaram ser, representa o tamanho da frustração a que chegaram. Vejam os exemplos da nossa praça (Lili Caneças, Moura Guedes…), tenho razão ou não?

• Aqueles tipos, para os quais já não havia massa encefálica que chegasse, por razões de mercado, a que nem a ilusão compensou. Esses tipos apostam tudo na aparência. É o ferro, os cremes, as vitaminas, os perfumes, o bronze e as tatoos. O impacto visual da aparência que possuem é inversamente proporcional à sua destreza intelectual. Quanto mais bonitos…mais burros. Contudo, podem sempre ter a ilusão de que são espertos…só espertos.

Mais exemplos haveriam que nos fazem levar à letra aquela máxima de que “o Natal é quando um homem quiser”. Há aqui qualquer coisa de machista, não acham? Deve ser por o Natal ter inspiração católica.

Aliás, mais ilusória que a figura do pai natal não existe. Um velhote de uma terra longínqua que traz prendas a todos os meninos, e entrega-as pelo buraco de uma chaminé e ainda por cima o tipo é gordo. Nada mais ilusório, não acham?
• Neste sistema em que vivemos, algo que aprendemos, muito duramente, desde pequenos é que nada é de graça. Mesmo que os nossos pais se matem a trabalhar para trazer um salário miserável, e para que possam proporcionar a quem os explora, o tal BMW que os faz sentir-se grandes, mesmo assim, nada é de graça. Logo, a figura do pai natal, o tal que dá prendas aos meninos que se portam bem, é para lá de ilusória, chega mesmo a ser sádica.

• Depois, pensando bem, o facto de ele trazer as prendas pela chaminé também tem algo de ilusório. É que a maioria das casas nem chaminé tem, pelo menos, uma chaminé em que ele possa entrar sem ficar triturado pelas ventoinhas dos exaustores ou assado pelas lareiras com recuperadores de calor. Logo, esta história, só pode estar mal contada. Isto não é ilusão, isto é desonestidade intelectual.

• Depois, quem inventa o pai natal é precisamente quem mais simboliza os pilares de um sistema que cedo os impõe a máxima de que nada é de graça. A Coca-Cola, um dos símbolos máximos do capitalismo. Ora, uma multinacional que subsiste através da exploração da mão-de-obra humana, que tudo nos faz pagar e que é o exemplo acabado do espírito mercantilista consumista que nos querem impor, vem criar a figura do pai natal, isto é violência moral. Os que nos tiram querem vir fazer crer que há alguém que nos dá? Ainda por cima gozam connosco, com a nossa miséria. Isto não há direito!

Mas, esta figura do pai natal é sem dúvida o exemplo mais emblemático e concreto da ilusão que quem mexe os cordelinhos deste sistema, nos quer criar. No fundo, quem manda nisto tudo, também quer fazer parecer que é uma coisa que não é. Por exemplo:
• Querem fazer crer que são democratas. Criam eleições fantasma, com partidos fantasma, e qualquer dia, como isto anda, até os eleitores passam a ser fantasmas. Já que, começa toda a gente a desacreditar nesta coisa. Aliás, já não falta muito, julgo que nas Honduras, por exemplo, para que os gorilas fantoches tenham ganho as eleições (com 70% de abstenção), devem ter votado os mortos…de morto a fantasma…

• Querem fazer parecer que são caridosos. Mostram o pai natal, mostram aquelas instituições de caridade que financiam e escondem as crianças indianas, vietnamitas, chinesas e outras que exploram, sem dó nem piedade, por um dólar diário, para poderem comprar mais uns aviões, uns ministros, secretários de estado e mercadorias desse tipo (alguns até compram caixas de robalos).

• Querem fazer crer que são a favor da paz e depois invadem o Iraque, o Afeganistão, a Palestina….não foi invadida? Pois não, mas parece.

Pois é, criam-nos esta ilusão, que no fundo resulta da natureza do próprio sistema. As coisas “são o que parecem e não o que são”. Só interessa o que parece, não o que é. Desta forma, o Natal até pode fazer parecer que pelo menos uma vez por ano todos podem ter, comprar ou fazer o que querem. Pelo menos uma vez por ano somos todos solidários, fraternos, respeitadores, caridosos. Isto é uma espécie dos 5 minutos de fama a que cada um tem direito na sua vida, como dizia Andy Warhol. Só que…nem eu tive ainda os meus 5 minutos, nem no Natal somos aquelas coisas todas, porque apenas se cria a ilusão de que o somos. Quais são as possibilidades de um brasileiro ou mexicano médio de ser caridoso? De ser solidário? De ser fraterno? Nem consigo próprio. A única coisa que pode fazer por si ou pelos demais é ter pena, ou então…rezar. Também dizem que resulta, é como o pai natal!

Contudo, isto está tudo muito bem montado, porque até esses pensam que podem ter e ser tudo isso, mas só no Natal. Aliás, esta ideia de criar-se um dia por ano para se ser tudo isso, foi sem dúvida uma grande ideia de quem manda nisto tudo. Assim, podemos ser o contrário disso tudo no resto do ano, com a desculpa de que não é natal.

• Não demos passagem a um peão numa passadeira. Não faz mal, não é Natal.

• Não demos prioridade a uma grávida numa fila. Não faz mal, não é Natal.

• Não dissemos obrigado a quem nos fez um favor. Não faz mal, não é Natal.

• Passámos à frente de toda a gente numa fila de trânsito. Não faz mal, não é Natal.


Estão a ver…Isto assim é fantástico. Como o Natal é só uma vez por ano…E até é no final do ano. E de propósito, é que assim, quando passamos para o ano seguinte, sempre podemos dizer, que o ano anterior acabou bem, logo o que chega também começa bem.

Como são boas as histórias do faz de conta que nos contam em crianças…
Também nos contam em adultos? Ah! Pois é.
Como também estou corrompido…
Bom Natal e Feliz ano novo, não é nem um pouquinho do tudo o que vos posso desejar, mas, por agora chega.

Hugo Dionísio
A Roletização do mundo


A partir do momento em que as bolsas entraram nas nossas vidas, nos nossos países, nas nossas casas e nas nossas empresa, todo o mundo se transformou numa enorme roleta. Uma roleta gigante, da qual o sistema financeiro é o pilar, fazendo todo o mundo rolar de acordo com a sua sorte.


Nesta roleta gigante, todos esperam que a bola algum dia acerte, ou caia em cima do número em que cada um de nós se tornou, transformou ou em que nos transformaram. Quando a bola nos cai em cima, fantástico, somos uns privilegiados, mais um dos cada vez menos numerosos privilegiados, que tiveram a sorte (ou o azar?) de deixarem de ser um mero número para a estatística. Enfim, é com esta ínfima possibilidade de a bola nos cair em cima que o sistema financeiro, que (des)regula o mundo, joga. É com a possibilidade sonhada, com a possibilidade da ilusão de uma dia também passarmos para o lado de lá, que o sistema nos compra e confunde. É assim que nos anestesiam.

Como em qualquer jogo de azar, a sorte é uma possibilidade remota, ínfima mas probabilística, e sendo probabilista, pode calhar a qualquer um. Contudo, neste jogo da roleta global, em que globalização financeira da economia nos transformou, as regras não são bem as de um jogo de azar normal. Neste jogo, a sorte calha sempre aos mesmos e o azar também. A única semelhança com os demais jogos que conhecemos é que este também só reverte a favor de uma meia dúzia.

Assim, transformaram este planeta num casino multinacional, onde a casa ganha sempre e os jackpots não existem, simplesmente, porque os prémios também não. Fazendo-nos crer que as regras são as da democracia, as da igualdade e as da liberdade, chegamos a pensar que um simples mortal numerado, também pode aceder às colunas do Olimpo. Mas não! Neste casino, as máquinas estão todas viciadas pela corrupção, pelo tráfico de influências, pelo favorecimento, pela clientela ou mais sofisticadamente falado, pelo lobbying. Os esquemas de vício são cada vez mais descarados, cada vez mais às claras, pois, para estes prevaricadores, não há penas, multas, coimas ou sanções de qualquer espécie. Não são eles que jogam, eles fazem jogar. E nós também não jogamos, nós somos apenas os joguetes. Então quem joga? Ninguém! Ninguém joga? Não! Pois se alguém jogasse, esse alguém, algum dia, por tão pura e simples ganância quanto a dos que mandam jogar, poderia, a qualquer altura do jogo, questionar a justeza das regras do jogo, a justeza dos prémios, a justeza das variáveis envolvidas. Assim, este jogo joga sozinho e reverte sempre, mas sempre, a favor da casa.


Tal como na roleta o prémio não calha aos números onde a bola cai, também nesta roleta global não é a nós que cabe o prémio, nós somos apenas os números. A nós só nos calha o esforço e o sacrifício para que o jogo aconteça. Quando muito, para nós este é um jogo onde, para participarmos nele, nem que seja como números ou joguetes, temos de pagar, sem que nos possa calhar qualquer coisa. Quando muito, somos como os empregados dos casinos, controlam o jogo, mas o prémio não lhes calha. Só que estes recebem ordenado, nós também. Recebemos um pequeno valor em troca do sacrifício de fazer o jogo funcionar, esse pagamento, nada comparável ao que produzimos, também não é para nós, é para as despesas do jogo. Somos nós que pagamos a infra-estrutura, somos nós que pagamos o combustível que faz andar a roleta, mas, como qualquer besta de carga que faz andar uma mó de um moinho, também não é a ela que cabe o pão, apenas recebe o indispensável, para continuar a conseguir colocar a mó a rodar.


Afinal, para além de números parece que somos umas bestas. Pois somos vítimas de tudo isto e, muitas vezes, não nos damos conta. Até quando vamos aguentar a regras deste jogo? Quando é que inverteremos as regras deste jogo?


Para que a bolsa funcione, qual pilar gigante de uma roleta maior, as empresas têm de ser volúveis e flexíveis, e como as empresas são constituídas por pessoas, também nós temos que ter vidas volúveis e flexíveis. Tudo o que possuímos passa a ser tão efémero quanto a estabilidade de uma acção na bolsa. Qualquer boato, qualquer rumor pode ter consequências nefastas nas nossas vidas. Tal é a ligação do sistema económico ao sistema financeiro, que, não é a economia que é o instrumento, somos nós o instrumento do sistema financeiro. Uma acção baixa na bolsa e vão milhares para o desemprego, simplesmente porque a acção tem de subir, para que quem manda no jogo, ganhe o prémio. Muito justo, este jogo. Será que aquela que diz ser a civilização mais evoluída da história da humanidade, pode ser governada por princípios tão bárbaros quanto a ganância, o egoísmo, o egocentrismo e vício? Será isto o princípio do fim da civilização ocidental? A tal que se baseava na democracia, na liberdade, na tolerância? Ainda acreditam que um mundo que se move ao ritmo do sistema financeiro é um mundo justo?


Mudemos a música que este disco está riscado…


Hugo Dionísio
Com moderação

 

Ai, se a revolta matasse….Estas seriam as minhas últimas palavras e se calhar não seriam tantas.

Ouvia eu a SIC notícias, passe a publicidade, quando me deparei com um dos exemplos mais concretos da manipulação mesquinha e subliminar, a que os senhores directores de informação dos nossos órgãos de comunicação social nos sujeitam. Será que não nos podemos queixar de violência moral? Devia de ser instituída a Comissão para a Defesa das Vitimas de Violência Moral e Desonestidade Intelectual da Comunicação Social (CDVVMDICS). Esta deve ser a maior forma de agressão do nosso, perturbado, status quo.

Já estou a imaginar o que se passa em algumas das redacções jornalísticas por este mundo fora. Lembram-se da lista de palavras que os censores do tempo da ditadura salazarista possuíam? Pois é. De certeza que hoje em dia também existe essa lista, não igual, mas uma mais moderna e “moderada”, na qual são estabelecidas as devidas correspondências quanto aos termos linguísticos a utilizar em cada acontecimento actual. Consigo imaginar também, algumas das correspondências constantes da mesma:

Trabalhador – Colaborador, funcionário, empregado
De esquerda – Radical, ultrapassado, datado
De direita – Moderado, moderno
Patrão – empresário, empregador, empreendedor, investidor
Muçulmano assassinado por israelitas, americanos, ingleses – abatido, eliminado
Soldado, guerrilheiro muçulmano – terrorista
Americano, israelita assassinado por muçulmano – assassinado, homicídio, morto a sangue frio, sem dó nem piedade
Bombardeamento de alvos civis por americanos e israelitas - intervenção localizada, dano colateral
Bombardeamento de país ou soldado muçulmano a alvos militares – ataque terrorista indiscriminado, genocídio, carnificina
Tortura praticada por americano a muçulmano – Maus-tratos, violência e assédio
Tortura praticada por muçulmano a americano - tortura
Imperialismo - globalização, comercio mundial, economia, G8
Bilderberg - Palavra proibida sob pena de despedimento sumaríssimo, com processo crime às costas.

Então, o que é que o súbdito jornalista disse que me deixou tão renitente face à informação que nos passam na comunicação social?

Como sabem, uma das maiores polémicas que se faziam sentir ao tempo da conferência Ibero-americana, era a visão que os vários presentes, altos dignitários de toda uma América latina, cada vez mais incendiada, tinham sobre a questão “Honduras”.

Dizia o linguisticamente preocupado jornalista que os representantes dos países participantes se dividiam em dois. De um lado, aqueles mais identificados com a esquerda, que condenam veementemente o golpe de estado e o posterior acto eleitoral. Aqui, não esquecer que por “de esquerda” deve entender-se “Radical, extremista, sectário, revolucionário”. De outro lado tínhamos, na verborreia subliminarmente seleccionada, do jornaleiro repórter, uma facção “digamos” mais,”, “moderada”, literalmente assim.

Se a palavra “moderada” quer dizer “conservador, de direita”, ou se por “moderado” se quer dizer “aquele que se vende, aquele que, face a um poder maior, prescinde das suas crenças e princípios”, então meus caros, não tenhamos dúvidas, eu prefiro ser “radical, extremista, revolucionário”. Com muito orgulho!

Mas esta situação ainda me fez trazer à colação mais duas relações muito importantes e em nada despiciendas.

A primeira é a de que, a revolta que senti pelo termo utilizado pelo subtil jornaleiro, fez-me contar quais os países a favor e contra a agressão democrática sofrida nas Honduras (ainda não compreendi como é que os EUA não invadiram esse país, nem os Intestinos Delgados deste mundo não apareceram a incendiar a opinião publica contra esse acontecimento). Descobri, que dos 21 países presentes, só a Costa Rica, a Colômbia e o Panamá não condenam o golpe e o acto eleitoral fantoche. Todos os restantes 18 incluindo Portugal, são unânimes na condenação. Coincidências das coincidências, estes três países possuem em seu território, uma base militar imperialista dos EUA. Já estão invadidos!

Outra das coincidências foi o facto de ter sido a mesa da presidência da cimeira a assumir a declaração de condenação da agressão democrática nas Honduras. Porque será? Eu posso adiantar uma explicação. Não se realizou uma votação face à declaração porque a derrota da facção “moderada” seria tão expressiva que resultaria num grave imbróglio internacional do ponto de vista diplomático, que poderia ser visto como uma “inaceitável” (para alguns) pressão sobre os EUA. E isso não poderia ser.

Mas ainda se podem retirar mais conclusões deste facto e acontecimento. Uma é a de que se o Sócrates e o PS fazem parte da facção “radical, extremista, revolucionária” que condena a agressão ao povo hondurenho, isto só podem ser boas notícias para o futuro. Quer dizer que o Sócrates e o PS são de esquerda e defendem com radicalismo os seus ideais e princípios. O país só pode, na minha opinião, ficar contente.

Outra conclusão é a de que nas redacções dos órgãos de comunicação social se promove em grande medida, a língua portuguesa. Promove-se a estilística, nomeadamente o eufemismo, quando se trata de amenizar os erros do poder económico e imperial. Pratica-se a hipérbole, quando se trata de evidenciar e exagerar as posições de quem não está no poder económico e imperial. E pratica-se a técnica da construção de glossários e dicionários. Esta técnica, bastante apurada nos nossos dias, é praticada pela procura e registo dos termos sinónimos ou não, que podem ser utilizados em substituição de determinadas palavras e termos a que o poder atribui significado ideológico.

Os jornaleiros, antes jornalistas, prosseguem a sua função principal, a da repetição das gordas, a da cantoria dos pregões e a da corrida á maior venda de audiências e jornais que for possível. Aliás, como se pode facilmente depreender, o jornalista é um profissional em desuso, pois como o que se vende é a imagem, vale mais um designer, um informático, um artista gráfico do que um jornalista, que são, normalmente estagiários mal pagos. Assim fazem o que lhes mandam sem questionar. Resultado, só lhes resta ser jornaleiros, pois a redacção, essa, está-lhe vedada e é reserva de meia dúzia de directores de informação, colocados cirurgicamente nos lugares, e de alguns assessores.

A presidência da cimeira declarou:

"Inaceitáveis as graves violações dos direitos e liberdades fundamentais do povo hondurenho". E defenderam que "a restituição do Presidente Zelaya ao cargo para o qual foi democraticamente eleito até completar o seu período constitucional é um passo fundamental para o retorno à normalidade constitucional".

Hugo Dionísio
Vamos Hibernar



Uma notícia interessante que registei no início desta semana e que me deu logo vontade de a aplicar, foi o facto de na revista de ciências Science Magazine ter sido publicado um artigo sobre a indução de um estado de hibernação num pequeno roedor.

Através da utilização de um gás como o sulfito de hidrogénio, foi possível reduzir a temperatura do sangue dos ratinhos até aos 5 graus centígrados. Esta redução fez com que estes mamíferos entrassem num estado de hibernação induzida em tudo semelhante ao estado de hibernação dos mamíferos que o fazem naturalmente.

Mas, o mais interessante da notícia foi a declaração do cientista responsável do projecto, o Dr.Mark Roth. Este afirmou que este estado é passível de ser induzido a qualquer mamífero, sim, a qualquer um, incluindo o ser humano.

E é aqui que a notícia ganha ainda mais interesse. Para que é que um ser humano precisa de hibernar? O Dr. Mark Roth adiantou algumas aplicações desta tecnologia:

• Em viagens longas, como a Marte, em que as pessoas vão a dormir, sem necessidade de alimentação e oxigénio, acordando quando lá chegam.

• Para o tratamento de variadas doenças, como o AVC, pois pode parar-se o organismo e tratar o problema

• Para tratamento de doenças como o cancro, pois ao reduzir a dependência de oxigénio das células normais, estas ficam menos vulneráveis à radiação química.

Mas estas são aplicações médicas e científicas. Sem me querer colocar ao nível deste eminente cientista, também eu, num plano mais social, tenho algumas propostas para utilização da hibernação induzida nos seres humanos:

• Quando não temos dinheiro para comer, resolve-se o problema da fome com a indução da hibernação. Tipo, estou com fome, vou mas é hibernar, assim não preciso de gastar dinheiro em comer.

• Quando os nossos filhos estão muito chatos no fim de um dia de trabalho, pomo-los a…hibernar. Pelo menos não são intoxicados pela televisão, PSP’s etc.

• Quando atravessamos um período de crise como este, em que tudo nos revolta e não sabemos como sair desta agonia…hibernamos. Pode ser que quando acordemos as coisas estejam melhores. Claro que neste país, se calhar, ficaríamos a hibernar para sempre.

• É preciso ter cuidado com os patrões, pois em vez de recorrerem ao Lay-off ainda introduzem uma alteração na lei laboral, para colocar os trabalhadores a hibernar. Para eles tem a vantagem de não terem de lhes pagar seja o que for durante esse período.

• Já os sindicatos passariam a reivindicar a inclusão nas faltas justificadas, do estado de hibernação. Até para o emprego era bom. Pois, metade da população activa hibernava enquanto a outra trabalhava.

• Quando estamos fartos do nosso chefe que passa a vida a chatear-nos a cabeça, colocamo-lo a hibernar. Com a vantagem de nunca mais o acordarmos, claro está!

• Quando a nossa mulher nos chateia muito a cabeça…hibernamos. E depois esquecemo-nos de acordar.

• Temos de emagrecer? Vamos hibernar. Olha se a industria da moda se lembra disto?

Portanto, estão a ver que estas são apenas algumas das aplicações possíveis para a hibernação, mas cada uma poderia utilizá-la para o que quisesse, para descansar, fugir, desaparecer, esconder-se, era um espectáculo. Quando perguntávamos por alguém, teríamos de adicionar o estado de hibernação a todos os outros possíveis. Então onde é que está o Manuel? Foi hibernar.

Ah..., com a vantagem de podermos hibernar fora do Inverno, passaríamos a veranear, Outonear ou Primaverear. Era só escolher a altura e deixar a mensagem no telemóvel ou no e-mail: “Estou em estado de hibernação até o dia 15, deixe mensagem que quando acordar…se acordar…contactá-lo-ei”.

Agora vejam as vantagens disto. Se houvesse uma escala de hibernação para cada indivíduo resolviam-se uma carrada de problemas civilizacionais. O do emprego, pois os que estavam acordados substituíam os que estavam a hibernar. Com este estado de hibernação colectiva o trânsito melhorava, o ambiente agradecia. O ser humano vivia mais tempo porque se desgastava menos, a segurança social só pagava a reforma sobre o tempo em que estávamos acordados, os patrões tinham que distribuir ainda menos, pois só precisavam de pagar salários a metade dos trabalhadores de cada vez, havia menos bandidagem, porque metade estavam a hibernar, eram necessárias menos escolas, menos hospitais etc. Já viram bem? Era um mundo de vantagens. Mas a vantagem maior de todas é que apenas era necessária metade dos políticos! Já viram o que se poupava no Orçamento de Estado?

Já sei! É na hibernação que está o futuro do nosso país. Assim poderemos atingir alguns dos elevados índices de desenvolvimento da Europa. Temos muita corrupção? Colocam-se metade dos políticos a hibernar e a taxa de corrupção desce para metade. Há muitos acidentes rodoviários? Se metade da população estiver a hibernar, só teremos metade. Há muitos acidentes de trabalho? Se só trabalharem metade….Há muito desemprego? Metem-se os desempregados a hibernar. O rendimento per capita é mais baixo? Metem-se a hibernar os que ganham menos. Temos uma taxa de qualificações mais baixa que os outros países. Metem-se a hibernar os mais desqualificados. Já viram se o governo se lembra de uma coisa destas? Para cumprir promessas eleitorais não há do melhor. Também só haveriam metade das promessas. Só haviam metade dos políticos.

Mas a Constituição passava a ter no seu primeiro artigo: “A Republica Portuguesa é soberana, baseia a sua existência na democracia, na igualdade e na obrigatoriedade do cumprimento do dever de hibernação com vista ao progresso social dos nossos cidadãos”.

Ah! Isto é que ia ser um país desenvolvido. Sempre em primeiro nos índices todos. Qual avestruz de cabeça na areia. Não é que às vezes não estejamos em estado de hibernação, pois alguém me consegue explicar que evolução teve este país nos últimos anos? Não teve? Se calhar a hibernação já começou. Lá que o Português gosta de se esconder, lá isso gosta. Hibernar vinha mesmo a calhar.

Não me digam que não vos apetecia hibernar um bocadinho?

Hugo Dionísio






Sobrevivente qualificado

Não concordo minimamente quando dizem que o povo português é um povo pouco qualificado. Afinal, como demonstrarei, tudo se resume ao facto de distinguirmos se estamos a falar de qualificação formal, obtida nos estabelecimentos de ensino, ou de qualificação informal, baseada na experiência do dia a dia. É que nesta última, meus caros, nesta última…os portugueses são com toda a certeza o povo mais qualificado do mundo!

Até nas chamadas ciências exactas, o português desenvolve, no seu dia a dia, um nível de qualificações de tal forma altíssimo, que, se avaliação houvesse às mesmas, chegar-se-ia facilmente à conclusão de que o Português é, afinal, muito bom na matemática. Talvez não se esteja a utilizar a metodologia de aferição mais correcta.

Foquemos as atenções nos pais e mães de família que, dias após dia, mês após mês, têm a necessidade de se acertarem continuamente com as exigências de sobrevivência impostas pela nossa impessoal sociedade. É preciso muito saber.

Entre contas ordenado, cartões de débito, cartões de crédito, cartões de débito-crédito, cartões de crédito ao consumo do Jumbo, Worten, Fnac, Sportzone, empréstimos Cofidis, renegociações de crédito, renegociações de spread, renegociações de prazos, agrupamentos de créditos e uma multiplicidade de produtos financeiros nos quais, incontornavelmente, o português médio vai suportando a sua sobrevivência. Ninguém melhor que ele domina estes produtos, as suas regras de funcionamento, possíveis conjunções (tapa de um lado e destapa do outro) e regras de incumprimento. Nesta vertente da sua vida, o português é o mais dotado do mundo em títulos de crédito, produtos financeiros e gestão de carteiras de…passivos (pensavam que eram activos, não!). Esta competência baseada na experiência do dia a dia é importantíssima. Ainda para além de fazer destas pessoas umas máquinas de calcular humanas, nas quais a operação matemática de subtrair ao orçamento disponível, ou a operação de somar ao saldo negativo da conta bancária se faz quase automática e instintivamente. Se a matemática for só somar e subtrair, os melhores matemáticos do mundo são portugueses. E assim se compreende porque é que os bancos são os que mais lucram no nosso país. Com tanta mão-de-obra altamente qualificada disponível, a produtividade e competitividade são enormes.

Outra matéria na qual o português é muito bom e experiente é na cronometragem e contagem de tempos. A corrida contra o tempo faz-nos comportar como autênticos relógios, para que não cheguemos atrasados ao trabalho ou à escola. Qualquer segundo que se consiga reduzir no corte da barba, no banho ou nas cosméticas, é importante para  ultrapassar-se o primeiro obstáculo do dia, o de sair de casa sem nos esquecermos de nada. Casos há em que se conhecem pessoas que saem sem sapatos, casaco ou mesmo calças, mas também podem ser coisas mais usuais como, o telemóvel, as chaves, a mala, entre outras coisas. Sem carro…humm…sem carro…é que não conheço ninguém que saia de casa sem essa importante peça de mobiliário, vestuário e de transporte, que confere um estatuto social imprescindível a qualquer português.

Mas é aqui que surge o maior paradoxo de todos, é que o facto de andarmos sempre de automóvel não faz de nós excelentes condutores. Se fizesse, ganhávamos todas as corridas de alta competição, mas não, somos mas é campeões de acidentes rodoviários.

Contudo há uma ou duas coisas em que somos muito bons com carros e nas quais temos muita prática. Estacionar é a primeira, estacionamos nos locais mais impossíveis de imaginar e chegamos a pensar que os passeios são para os carros e as estradas para os peões. A outra é limpar e lavar o carro, havendo pessoas que passam horas infindáveis, fins-de-semana inteiros de volta do seu namorado ou namorada de quatro rodas. A outra é o equilibrismo de falar ao telemóvel enquanto se conduz. Nesta modalidade malabarística somos os maiores do mundo! Como adoramos conduzir de telemóvel ao ouvido, ou então, a falar para o ar como maluquinhos que falam com vozes que pairam na sua cabeça. É um paradoxo enorme, aliamos aquele que queremos que seja o nosso maior objecto (o carro) com aquele que queremos que seja o menor (o telemóvel). É o derradeiro paradigma existencial português. Já não bastava português pequenino em carro grande, agora temos português pequenino em carro grande com telemóvel minúsculo! É uma espécie de oito ou oitenta num mesmo ser.


Outra competência ou qualificação importante surge no caminho para o trabalho. Novamente a matemática ocupa o espírito do português. A necessidade de utilizar este conhecimento científico surge na primeira bomba de gasolina. Quanto combustível comprar para esse dia? Bem, se desligar o motor nas descidas, nas filas e semáforos, talvez consiga fazer o percurso com 5 euros. Conduzir torna-se um desafio enorme mas com vantagens para a sociedade a diversos níveis, poupa-se combustível, emitem-se menos gases e o meio ambiente agradece. O condutor treina o cálculo matemático, principalmente ao nível das médias simples ou ponderadas e torna-se especialista em cronometragem de calibragem de tempo/acção. Conduzir assim, passa a ser um meio de auto formação universal. Num país onde as empresas não querem formar os trabalhadores, esta é uma forma nada desprezível de cada um o fazer. Afinal, o facto de cada um levar o seu carro todos os dias tem a sua utilidade!

Outra competência é treinada, sensivelmente duas horas depois, principalmente quando já se está cansado de cálculos, cronometragens, sinaléticas gestuais e vocábulos de bola vermelha, quais grunhidos de fera ferida pelas complicações da vida. O desafio que leva ao conhecimento e à qualificação é o estacionamento da viatura, funcionando como uma espécie de módulo 2 da auto formação diária. Já ouviram falar de formação em contexto de trabalho? Esta é a formação em contexto de vida. A melhor forma de formação para quem não gosta de frequentar formação. Se calhar isto até dá jeito às empresas…Se calhar elas até pensaram nisto quando não investem em formação. O que é que elas têm a ver com isso? O mesmo que aquele patrão do Porto que dizia que pagava salários baixos aos seus trabalhadores, porque no norte, as pessoas têm sempre uma pequena hortinha para plantar alguns víveres. Chama-se a isto, conciliar o trabalho com a vida familiar. Os patrões preocupam-se com isto, estão a ver?

Então ao estacionar, têm de resolver-se vários problemas:

Problema 1: O cálculo de área. Com a corrida que existe aos lugares sem marcação EMEL, cada vez mais tem de estacionar em locais cada vez mais pequenos. Aqui, a imaginação do português médio chega a ser surpreendente, consegue colocar objectos em áreas, cujo tamanho fazia prever que tal não fosse possível. O português torna-se especialista em dominar as leis da física a seu bel-prazer. Entre riscos, empurrões safanões, voltas e reviravoltas, até Einstein se revolta no seu túmulo. Quem é que diz que somos maus a físico-química?


Problema 2: O controle do tempo e metodologias de amostragem e observação. Depois de estacionado há que prever de quanto em quanto tempo passa o polícia da câmara. Pois como o local não está marcado pela EMEL, o mais provável é que lá nem se deva estacionar, pelo que, e aqui o cálculo das médias volta a ser indispensável, também sendo necessário calcular a probabilidade de bloqueio do automóvel. E a conta não é fácil, pois é preciso cruzar o que se pagaria diariamente por um lugar num espaço de parquímetro, com o que se paga mensalmente para mandar retirar o bloqueador da roda do automóvel. Mas aqui, nesta ultima solução há uma vantagem que faz mandar às malvas a maioria das regras, sabem qual? É que enquanto o estacionamento do parquímetro tem de ser pago na hora e no local, o pagamento para retirar o bloqueador das rodas pode ser pago com cartão Visa. Ou seja, dá para mandar a conta lá para o futuro, que já está mais do que hipotecado, logo, não se notará a diferença. E nesta competência o português não é grande coisa, a da futurologia, pois as suas previsões falham sempre. O melhor é fazer como o outro, prognósticos só no fim!

Problema 3: Estudo das alternativas e solução de problemas (problem solving): Caso só existam lugares pagos, há que inventar estratégias de gestão que permitam contornar alguns custos perante uma despesa tão incontornável como a que está associada ao uso do automóvel. Pode optar-se por dar uma moeda ao arrumador e assim, deixa-se o vidro do automóvel um pouquinho aberto, permitindo ao arrumador lá colocar o título respectivo, em caso de passagem dos fiscais da EMEL. Outra alternativa é a do cálculo do tempo versus probabilidade. Coloca-se a menor quantia possível logo antes da passagem do fiscal e depois volta-se a fazer o mesmo aquando do seu retorno e por aí fora. O problema é se a escala muda. Nesse dia há bloqueador, mas mesmo assim compensa largamente o pagamento sério e completo. Muitas outras alternativas poderão ainda ser estudadas, pois as barreiras da sobrevivência tornam o português um ser arguto, esperto e tremendamente criativo. Já viram se Portugal usasse esta criatividade para aspectos da vida menos incontornáveis mas mais indispensáveis? Pensem nisso.

Problema 4: Defesa pessoal: Na maior parte dos dias a coisa vai só com umas bocas, algumas asneiras e às vezes meras ameaças de ofensa à integridade física. Mas dias hão em que a competição pelo lugar de estacionamento é tanta que há que puxar dos galões da defesa pessoal. Este é o local de treino favorito do português. Exercita-se e treina os dotes de lutador. É o exercício diário da manhã. Ainda dizem que os portugueses fazem pouco desporto.

Ora, quando se chega ao trabalho, já se praticou economia, gestão, finanças, alguma física, muita engenharia e até luta livre. Ah, já me esquecia, a sua argúcia em contestar coimas da EMEL e da Polícia, também o fazem praticar algum direito. Já não lhe falta quase nada para ser Doutor. E ainda dizem que os Portugueses têm poucas qualificações. Basta substituírem os critérios de medição. Qualificações para quê? Para a vida ou para o trabalho? É uma questão de conciliar uma coisa com a outra!

Dizerem que os portugueses são pouco qualificados é que é um erro que políticos, patrões e outros tubarões cometem. Num pais caótico os portugueses mandados conseguem sobreviver. Os outros não conseguem fazer sobreviver o país em que mandam. Será melhor trocar então!

 Viva a verdadeira qualificação ao longo da vida

 Hugo Dionísio
Uma nova geração de desportistas


Longe vão os tempos de Rosa Mota e Carlos Lopes, incontornáveis maratonistas do desporto mundial, que, à falta de um centro de alto rendimento desportivo em Portugal, tinham de deslocar-se a Espanha para aplicar determinadas metodologias de treino.
Nos dias que correm, é visível a evolução neste campo. Portugal, pode orgulhar-se de, actualmente, conseguir formar, dentro das suas fronteiras, toda uma estirpe de atletas de altíssimo nível competitivo que, em alguns casos consegue mesmo exportar para as mais altas instâncias internacionais.
E digo isto, não por ironia, mas por crer que as manobras praticadas são de tal forma arriscadas e radicais, que nalguns casos a queda é inevitável, embora este país tenha certas redes que, também elas de elevado nível, nunca cedem. Digamos que, a tecnologia de suporte tem acompanhado a técnica que se pratica.
Como nestas coisas nunca é bom generalizar, sob pena de sermos alvo de alguns imponderáveis desaguisados, por parte de pessoas, que pela sua humildade, consideram não ser justa nem merecida a sua inclusão neste rol de excelência, pois o Português, algo que preza muito é o mérito, assim, passarei a enumerar os exemplos mais emblemáticos da grande evolução atlética do nosso amado país:
• Salto à Vara. Armando de sua graça, tão bom que o apelidam de Vara, é o exemplo máximo do atletismo de salto em Portugal. Qual Évora qual carapuça. Nem Évora é nome de desporto, nem o salto dele se compara com o de Armando. Se um no triplo salto chega aos 18 metros, e ainda se queixa de não ter uma pista própria para seu treino, o Armando, que nunca se queixou, saltou muito mais do que 18 metros, e não foi de cumprimento, foi de altura! De caixa de um banco a Ministro da Administração Interna! Quantos metros vão? Então…e se for…de caixa de um banco a n.º 2 do Conselho de Administração do BCP, maior banco português? Se calhar ainda são mais metros! Ou, noutro campo, também ele de grande virtude, neste caso, nos domínios da performance mental, que tal…saltar desde o nível secundário para a pós graduação directamente? Com Varas destas não há altura que aguente…
• Trapézio. Este exemplo é admirado pela sua persistência quase doentia. Este homem salta de nível em nível, ininterruptamente, passando dos mais altos para os mais baixos e quando pensamos que vai cair de vez, qual triplo mortal ou dupla pirueta, é vê-lo agarrar-se ao último baloiço que por ali, por acaso passava, enviado por um qualquer protector divino. Vindo de Santana para se chamar Lopes, ele mesmo, Santana Lopes. De suposto jurista a presidente do SCP, saltando para Figueira, passando para Lisboa, pelo meio o PSD e até para 1.º Ministro, por entre secretário de estado e consultor da EDP, Santana apanha sempre o último baloiço e não há rede que se lhe rompa, tanto faz, porque ele não cai.
• Montanhismo/Escalada. Não se pode ser Mole para se chegar ao Topo do Mundo. Logo, a sua graça só poderia ser Durão, Durão barroso. Já lhe chamaram de peixe, mas se peixe for, de certeza é fora de água. Mais parece um pássaro, pois a sua escalada da base ao topo é sem dúvida de se lhe tirar o chapéu. De simples militante do PSD, fez a sua primeira escalada, chegando logo a Ministro. Depois, foi só esperar, e a subida ao cume da mais alta montanha nacional foi demasiado rápida para se ter feito a pé e a trepar, pelo que, umas viagens a Angra dos reis terão ajudado a recuperar o fôlego. A voar, talvez, porque este senhor tem meios que os fins desconhecem, lá chegou ao topo da estrela, a 1.º Ministro. É claro, que Durão queria mais, ele queria a montanha mais alta de todas, ainda não a conseguiu, mas como homem preparado para a guerra que é, já chegou à mais alta da União Europeia. Mas, todos sabemos, que pela sua dureza e pela estrutura competitiva que comporta, outros voos mais altos estarão na forja, rumo ao cume mais alto de todos, mais alto ainda que o Everest. Pode ser que entretanto lhe falte o oxigénio, ou congele a língua, a sua principal arma voadora!
• Jogging. Pode não ser o mais rápido, mas não é de certeza o mais lento. Pode não ser o mais forte, mas não é certamente o mais fraco. Pode não ser também o melhor, mas não é o pior. Tem nome de pensador, e só o nome talvez o ajude na táctica, pelo que, qual maratonista, correndo por detrás, chegou-se à frente e agora não há quem o aguente. José Sócrates. Cedo começou na JSD, mas como nestas coisas se escolhem os melhores atalhos, lá mudou para o PS. Foi secretário de estado, ministro e concorrente à liderança do PS, e, tacticamente perfeito, aparece na altura certa para cortar a meta como 1.º Ministro. Todos sabemos que talvez abusará do doping, mas ainda não foi apanhado! Também sabemos que falsifica os tempos, mas não existem provas! Sabemos até, que colocará algumas barreiras no caminho de adversários, mas não se sabem bem quais! O que conta é que ele ganha e vamos a ver se não é com record.

• Full-Contact. Para ele vale tudo e não há adversário que resista. Do maior ao mais pequeno, esta pessoa parece sempre levar a melhor e mesmo quando parece definhar, qual peixeiro que sem peixe só lhe resta a voz, para vender o que não tem, lá vem ele dos confins da obscuridade para nos bater a todos, violentamente e sem dó nem piedade. Este também dá com o que não tem. Não tem honestidade, mas bate-se com a honestidade, tem seguranças, mas fala da insegurança, é rico, mas fala dos pobres, devia estar preso, mas fala como se fosse inocente, tem horror a pobreza mas não sai lá do meio. Para ele vale todo o tipo de golpe e em qualquer parte do corpo. Quando achamos que está KO, lá aparece ele numa qualquer feira a treinar o corpo a corpo e como um murro no estômago, damos conta de que está OK. Paulinho para uns, Portas para outros, não há golpe que não conheça, nem conhecimento que não utilize. Não tem corpo para tal, mas como luta com o que não tem, não interessa, está sempre em combate.
Estes exemplos podem ao menos dar-nos uma motivação. Se eles lá chegam, porque não havemos de lá chegar nós? Só nos falta a rede, pois eles quando dão um trambolhão, normalmente são amparados, sabe-se lá por que braços de qual polvo, e nós não usufruímos disso, para nós é tudo muito mais difícil. Mas lá que Portugal tem um centro de alto rendimento para estes desportistas, lá isso tem.

Hugo Dionísio
Para assuntos da população, gente sem vocação!



Desemprego. São economistas, advogados, médicos e outros doutores, todos com altos cargos e no topo da vida. Portadores de vários contratos de avença, empreitadas, consultas processos e que tais em fim. Precisavam da ubiquidade, mas desse dom não parecem usufruir. Ninguém está mais habilitado do que eles para abordar a problemática do desemprego. Como é bom ouvi-los a dizer em voz bem alta: - JÀ NÂO EXISTEM EMPREGOS PARA TODA A VIDA!

Salários. Por entre jornalistas, analistas e outros “show” makers, principescamente remunerados, o tema mais discutido é o dos elevados salários do país que não deixam a economia nacional disparar. De salários baixos também estes podem falar. Como dá gosto ouvir dizer, com ar de quem domina a ciência: - AUMENTOS NA FUNÇÂO PUBLICA ESTE ANO TÊM DE SER CONGELADOS!

Pobreza. Tudo gente bonita, bem vestida e temente a deus. Homens e mulheres de legiões de ajuda aos pobrezinhos. Sortudas e sortudos de uma vida caridosa, encostados à sorte que outros construíram, mas que alguns roubaram, furtaram ou que oportunistamente aproveitaram, que dedicam o seu tempo livre a ajudar pobrezinhos. Eles sabem como ajudar. Pobreza é lá com eles. E com ar de entendidos disparam: - PARTICAR A CARIDADE É UM DEVER DA CRISTANDADE!

Insegurança. Senhores de motorista, rodeados de seguranças, uns, de capangas, outros. Em redomas de aço transparente, onde a realidade não toca nem contagia. Senhores e senhoras, com voz na televisão e na rádio queixam-se da insegurança. Disso percebem eles. É como ouvir Portas, num mercado a vociferar: - MAIS POLÍCIA SE FAZ FAVOR, TEMOS DE ACABAR COM A CRIMINALIDADE (como lhe dou razão!).

Discriminação de mulheres. Ministro da Igualdade. Senhor presidente da comissão para a igualdade. Comissário para a luta contra a desigualdade. De discriminação de mulheres, de certeza que percebem. E percebem tanto que já os ouço dizer: - É NECESSÀRIO PARTILHAR O PODER COM ELAS!

Menores e crianças. Juízes, advogados, sociólogos e psicólogos, todos preocupados com a tutela. Tutela este, tutela aquela, tutela assim, tutela assado. Tutelo eu, tutelas tu. De tutelados e tuteladas percebem eles. Já estou farto de ouvi-los dizer: - É PRECISO DECIDIR NO INTERESSE DA CRIANÇA!

Estrangeiros e emigrantes. Portugueses, nacionais genuínos, nunca saídos, nunca migrados, imigrados ou emigrados. Falantes da mais comum língua de Camões. Das línguas de outros escritores geniais, nem ouvidas nem faladas. De problemas de integração, acolhimento e igualdades de tratamento, do que eles, ninguém sabe mais. E dizem em bom português para estrangeiro ouvir: - É PRECISO GARANTIR IGUAIS DIREITOS AOS EMIGRANTES. Outros temos que também dizem: - A CULPA DISTO TUDO É DOS EMIGRANTES!

Sexualidade. Preservativos e outros meios contraceptivos? Padres, Priores, Bispos e Cardeais, absolutamente misericordiosos e castos também. São os mais aptos a falar de sexualidade, com toda a certeza. E com ar santo dizem: - RELAÇÔES SEXUAIS SÒ PARA REPRODUZIR! (que o diga o padre Frederico).


Finanças Públicas. Gestores, empreendedores, investidores e outros aproveitadores de públicos subsídios, entendidos em livre iniciativa e em mercado aberto, são grandes comentadores de assuntos de estado. Quando se trata de despesa pública, normalmente ouvimo-los dizer: - O ESTADO TEM DE CORTAR NAS DESPESAS SOCIAIS!

Segurança Social. Outra vez Gestores, empreendedores e investidores, mas também governadores e outros credores, acumuladores de várias prestações de reforma, adquiridas de passagem sem permanência em locais de distribuição de riqueza de acessibilidade ultra-limitada, costumam dizer: - É NECESSÀRIO BAIXAR A TAXA SOCIAL ÙNICA DA SEGURANÇA SOCIAL! AS PESSOAS TÊM DE SER RESPONSÀVEIS PELA SUA PRÒPRIA REFORMA!

Direitos dos trabalhadores. Programas de televisão, programas sem televisão, todos e sempre na discussão do que se convencionou de apelidar de privilégios, regalias e oferendas. Como se não houvesse precariedade e exploração, patrões, empregadores, empreendedores e Investidores, levantam e bandeira dos trabalhadores e com ar de que com eles se preocupam dizem a toda a voz: - É PRECISO MAIS FLEXIBILIDADE! A LEI É MUITO RÌGIDA! COM TANTOS DIREITOS NÂO È POSSÌVEL TRABALHAR!

Política. Oportunistas, vendedores da banha da cobra, amigos do alheio, trapaceiros de toda a espécie, reúnem-se, nalguns locais muito mal afamados. Frequentadores de antros de vício e perdição que ninguém respeita, dizem, como se nós acreditássemos: - È PRECISO CONFIANÇA! NÒS VAMOS DESENVOLVER O PAÌS!

Serviços públicos. Outra vez…gestores, investidores e empreendedores, alguns deles grandes estupores, responsáveis por falências fraudulentas, falências genuínas, insolvências e outras incompetências, em uníssono, é ouvi-los lamentar da sua sorte desgraçada: - HÀ QUE DAR OPORTUNIDADE À INICIATIVA PRIVADA! A GESTÂO PRIVADA È MELHOR DO QUE A PÙBLICA!


Não há dúvida que neste país, são sempre os mais interessados a tomar conta das coisas com as quais estão menos identificados!

Hugo Dionísio
Sons da Alma



Estou num café, mas podia ser num teatro, numa reunião, numa sala de formação ou num transporte público, porque o Português não perdoa…

De em lado ouço um pouco do último hit anglo-saxónico popularucho em primeiro no Top das vendas discográficas. Raio de país este que confunde quantidade com qualidade, aparência com substância e harmonia com melodia. Este complexo de acharmos que o estrangeiro é sempre melhor que o nacional…

Passado algum tempo ouço um pouco de jazz, de Miles Davos a Coltrane e agradeço aos meus pais terem-me concebido e feito nascer neste culto e evoluído país, amante de gostos requintados e extravagantes…

Mais alguns segundos e já estou a ouvir a última do Quim Barreiros, e praguejo contra a ignorância, a imbecilidade e a incultura que continuam a grassar neste país 35 anos após o 25 de Abril…

Ainda não acabei os insultos e já ouço uma Kizomba. Que país alegre e com ritmo, vazio…vazio, mas mesmo assim colorido de forma tão berrante quanto a altura do som que ouço…

Por entre coloridos e floridos chego mesmo a ouvir a última do Tony Carreira e logo retrocedo na cor e na alegria. Nesse momento chego mesmo a chorar, tal a tristeza de pensar onde chegámos sem querer saber para onde vamos, tipicamente português. Que coisa mais fácil de ouvir não existe!

De repente, vindo não sei bem de onde, como um trovão, ressoa, qual martelo pneumático, uma sonda metálica que perfura os meus ouvidos sem dó nem piedade. Alguém é capaz de ouvir isto? Será isto rebeldia? Será isto querer marcar a diferença? Não chego a perceber.

Logo depois ouço, ao longe, vindo de forma subtil, uma sonoridade tribal, meio étnica, a fazer lembrar o retorno às origens e penso que talvez neste país ainda haja quem ame a natureza e a paz de espírito…

Ainda me encontro em meditação, mas acordo de repente do estado letárgico em que entrei para ouvir o mais alto, desclassificado e tradicional toque de campainha. Que raio de falta de gosto, que cinzentismo, que falta de ambição, de espírito, de capacidade criativa…

O concerto segue com musica electrónica que me faz entrar na era espacial. Chego a pensar que deixei este país em direcção ao futuro. Uma coisa e outra não são, claramente, compatíveis. Algo parece deslocado naquele som. O futuro aqui deve ser uma qualquer discoteca onde todos se olham, tocam e no fundo…nem se vêm. As aparências enganam…

A meio da viagem sou travado por um sons animalescos, burros, cães, cavalos e outras bestas que me fazem lembrar imediatamente algumas pessoas…

Ouço, entretanto, uma guitarra portuguesa, portuguesinha de todo, acompanhando uma voz tão triste quanto magnifica, tão doce como deprimente, tão bela como escura, tão cinzenta como pacífica e penso…que raio de fado o nosso!

Estes telemóveis podiam ser espelhos…
Hugo
Parasitas



Na ânsia da modernidade, do progresso e do desenvolvimento, Vila de Cegos, uma pequena cidade, cujo nome mais não reflectia do que a incapacidade para se utilizar o instrumento óptico para ver e não para olhar, ficou muito contente quando descobriu que o seu monte mais alto e volumoso, de verdejantes pastos e poiso de plantas, aves e animais de todas as cores e tamanhos, por mão humana ou divina, possuía um filão enorme de minério.

Estamos ricos! Estamos salvos! Finalmente vamos sair da pobreza! Estas eram conversas reinantes nos mais variados espaços públicos. Foram dias e dias de festas, boas disposições e ilusões. Finalmente iria haver emprego com fartura, desenvolvimento, progresso e evolução. Uma empresa multinacional já tinha garantido a concessão da exploração e as perspectivas eram animadoras. Finalmente os filhos de Vila de Cegos iriam ter acesso a uma vida melhor.

Vila de Cegos, com o seu rio de águas prateadas, de peixes saborosos que se apanhavam à mão, de solos abundantes, onde o poisio era uma miragem porque desnecessário, de ares e aguas termais, onde a saúde era uma obrigação e uma imposição, considerava-se, estranhamente, uma vila pobre. Diziam os seus habitantes que lhe faltavam os néons, os automóveis, as buzinas, as rotundas, os semáforos e até o cinzento do cimento em altura. Faltavam-lhe os prédios e as estradas, faltava-lhe vida, ao que diziam. Vila de Cegos era, naturalmente, uma vila sem artificialidade.

Passado algum tempo, nunca a vidinha tinha ido tão bem. Carros cada vez maiores circulavam na vila, é claro que nenhum era dos seus habitantes, mas ao vê-los passar, todos pensavam que um dia poderiam lá chegar. Casas e mais casas, com esgotos e mais esgotos, o espaço humanizado massificava-se e tirava forma à natureza.

Era o progresso, a modernidade e a sofisticação. A empresa mineira, extraía de dia e noite, sem parar, em turnos rotativos que esgotavam aqueles que neles se integravam. Valia a pena, pensavam, por um futuro melhor, valia a pena, mesmo que o presente prometido ainda não se estivesse bem a ver. Mas, como se costuma dizer, o sonho comanda a vida e a esperança é a última a morrer. Mesmo as famílias das vítimas de acidentes e doenças continuavam a pensar que valia a pena.


Subitamente, o minério começou a escassear. Tinham passado muitos anos sob o ritmo de uma exploração cada vez mais desenfreada e intensiva. Não fazia mal, o que importava era produzir mais e mais riqueza. O problema é que, para além da abundância de ritmo, havia abundância de gente, de casas, de carros, de estradas, de rotundas, de sinais e de…centros comerciais.

Do rio espelhado e prateado, dos campos frescos e verdejantes, dos solos reprodutores sem fim, do ar e águas revitalizadoras já ninguém se lembrava, tinham caído no profundo esquecimento dos mais velhos. Os tempos eram outros, diziam os mais novos.

Na sequência da crescente escassez de minério, a produtividade começou a descer, de repente o gráfico da rentabilidade começou a apresentar uma tendência de evolução decrescente. Não é que não desse lucro, não é isso, o problema é que o lucro já não subia de ano para ano, agora, descia de ano para ano, mas ainda existia.

E a empresa começou a prospectar noutros locais e a mais aterradora e antes imprevisível das notícias surgiu. A empresa ia deslocalizar-se. A empresa tinha encontrado minério noutro local, muito minério para explorar. Um novo local, onde o gráfico iria voltar a crescer.

O emprego foi-se, o ordenado foi-se. A população teria de virar-se novamente para o passado, teria de virar-se novamente para as actividades tradicionais.


Tal como o emprego se tinha ido, também a juventude havia tido o seu tempo, somente os doentes e velhos sobraram. A mina tinha feito as suas vítimas. Mas também tinham ido as águas prateadas do rio, os seus peixes morrido envenenados de metais pesados libertados pela mina. Os solos poluídos de metais não menos pesados, agora…nem com pousio lá iam. Igualmente os campos verdejantes estavam secos e os ares e águas rejuvenescedores tinham envelhecido como tudo o demais. Vila de Cegos estava mais pobre do que nunca. Melhor, agora, Vila de Cegos não era pobre, era miserável. Dezenas de anos de mina e no fim, para além de ninguém ter acumulado o suficiente para sobreviver, o pouco que tinham deixaram de ter.

A ilusão do progresso, da modernidade e da sofisticação deu lugar à depressão. Tanto trabalho, tanto esforço, tanta exploração e Vila de Cegos encontrou-se mais miserável que nunca.

Vila de Cegos mudou de nome, talvez se tenha passado a chamar Vila de Vistas e assim talvez possa ver uma luz no fim do túnel. Pelo menos algo aprendeu. A riqueza só vale a pena, se for para ser distribuída.

Até quando continuaremos a ter empresas parasita?

Hugo Dionísio
Da casa de banho à política vai o passo de um casamento!




Numa tomada de posse de uma pequena junta de freguesia, a lista maioritária, composta por dois partidos, conseguiu eleger 4 representantes em 9. O partido que ficou em segundo lugar elegeu 3 e outros dois partidos elegeram mais um cada.

Até aqui tudo bem. Nas semanas subsequentes ao acto eleitoral para as autárquicas, e antecedentes à tomada de posse, iniciaram-se as movimentações com vista à constituição de um executivo, com 4 elementos e que teria de ser aprovado por maioria simples na primeira sessão da assembleia de freguesia, que nesse dia e local tomava posse.

Facto 1. O partido maior da coligação, ao enumerar os membros que queria colocar no executivo, não incluiu um membro do partido mais pequeno. Do tipo, primeiro usámo-los e agora deitamo-los fora! Ou melhor…Casei contigo e agora quem manda sou e se falas muito…corto-te o pio!
Facto 2. O partido mais pequeno da coligação, sentindo que o acordo não estava a ser cumprido, decidiu retirar-se da coligação. Divórcio? Nem pensar, o pretendido era mais uma espécie de envenenamento fulminante!

Facto 3. O partido maior da coligação, decidiu contactar os restantes partidos com vista à celebração de um acordo pós-eleitoral que lhes garantisse a aprovação do executivo da junta na assembleia de freguesia. Para tal, prometeram o cargo que não haviam atribuído ao partido com quem tinham o acordo de coligação pré-eleitoral. Adultério? Antes morto à pedrada!

Facto 4. Nenhum dos outros partidos aceitou o cargo ou acordo, pelo que, no dia da tomada de posse, ainda não era garantido que se conseguisse aprovar um executivo para a junta. Afinal todos ouvimos falar de famílias desestruturadas e mono parentais.

Na sequência destes acontecimentos, os nervos andavam à flor da pele. Por entre telefonemas de bastidor, conversas nos cantos e recantos, promessas cumpridas e comprometidas, mas que, pela lógica, não eram para cumprir, os vários partido lá iam fazendo o seu jogo político, qual jogador de poker sem cartas, mas com uma lata imensa para o bluff.

Aliás, as estratégias delineadas, pela capacidade de improviso fariam corar o melhor dos estrategas. A verdade, é que à chegada ao local da tomada de posse, logo me confrontei com o cheiro nauseabundo a política de trazer por casa, mas não por qualquer casa, de trazer por… casa de banho.

Pelo que, a sucessão dos factos que em seguida enumerarei não mais será do que o desenrolar de um rolo de papel, daquele papel que todos sabemos para o que serve e com o qual fazemos coisas mais limpas do que a sujidade que abunda na consciência de alguns daqueles que, infelizmente, se constituem (pelo menos é o que eles acham) como a reserva político-estratégica da nação. O que dava vontade de fazer era puxar autoclismo e vazar tudo, desinfectar de seguida e voltar a fazer outra vez, a ver se desta saía algo mais limpo.

Mas vamos lá ao “rolo” de acontecimentos:

Volta 1: quando cheguei, na qualidade de membro de uma das listas concorrentes, deparei-me com uma reunião de emergência, em plena rua. Aquele que se me apresentou como o “núcleo duro” do partido mais pequeno que havia concorrido à coligação, tinha ido ter com todos os partidos da oposição, pedindo-lhes que votassem contra a constituição do executivo a apresentar mais tarde, pelos seus, até aí, parceiros de coligação, na já muito desgastada assembleia de freguesia (ainda nem tinha tomado posse, a assembleia);

Volta 2: É claro, que nenhum dos outros partidos revelou qualquer compaixão pelo partido vítima de violação dos deveres conjugais (È sempre a parte mais fraca que se lixa, mas, quem os manda casar por interesse?), e nesse sentido, mantiveram a mesma perspectiva quanto ao sentido de voto que pretendiam evidenciar algum tempo mais tarde;

Volta 3: Enquanto isto, andava o marido da coligação, também de roda dos partidos da oposição (principalmente dos que haviam eleito só um representante), oferecendo o que havia negado à mulher, o cargo de 1.º secretário da junta. Os partidos da oposição, por não quererem meter a colher entre homem e mulher, não aceitaram a oferta, não acreditando em ofertas natalícias antes de 25 de Dezembro;

Os ânimos iam ficando cada vez mais pesados e agressivos. A violência doméstica era eminente. Nunca uma luta por um lugar numa casa de banho tinha ido tão longe. De violência física não me lembro, não presenciei, mas também não nego a sua existência, provavelmente terá ficado fechada entre as quatro silenciosas, surdas e mudas paredes do lar conjugal. Mas violência verbal, moral e ética, meus caros, essa ia crescendo como os lucros das gasolineiras que nos furtam o nosso dinheirinho diariamente.

Os corredores do Centro de Dia para Idosos, inaugurado nesse próprio dia, estrearam-se com aquelas que deverão ser as conversas mais animadas, mal criadas e mal intencionadas do resto dos seus dias. A não ser que seja um Centro de Dia para políticos reformados, aí, já não digo nada.

Ele eram ameaças de quebra da coligação ao nível nacional, ele eram ameaças de se desfazer uma amizade que já prevalecia, entre interesses mesquinhos e egoísticos, há mais de trinta anos (pelas palavras dos eleitos, é óbvio), ele eram ameaças de divórcio sem retorno possível, condenando os cônjuges à mais violenta das solidões políticas, uma espécie de viuvez antecipada, sentida mas não concretizada.

No meio disto tudo, populares havia que, presenciando todo este espectáculo circense, mas daqueles circos de carroça, em que o carroceiro é tratador dos burros, monta a tenda e no fim é palhaço (até aqui a similaridade é enorme, coincidência? Não, este palhaço é honesto, os outros, nem por isso), dizia, populares havia que iam abandonando a sala, revoltados com o espectáculo, pois o bilhete vendido e o programa entregue não faziam prever aqueles números.

Mesmo assim, numa sala cheia de curiosos, que resistiram até ao último momento para ver como acabaria a desgraça, lá se deu início à tomada de posse. É durante o discurso do novo presidente da junta (acompanhado de demasiado perto pelo anterior presidente, que depauperou os cofres da junta e se prepara, mesmo assim, para lá ficar como assessor, qual amante cuja paixão é mais forte do que o medo de ser apanhado) que se dá a reviravolta no enredo deste Sketch do “Gato Fedorento”. Durante o seu discurso, o anterior presidente (cessante mas não cessado) vai falar com o “núcleo duro” do partido mais pequeno da coligação e diz-lhe que afinal aceita colocar o seu eleito no executivo da junta. Ah ah?! È aqui que a violência doméstica acaba. Afinal há lugar para os dois naquela casa de banho!

Na sequência do retrocesso verificado ao nível do abuso de posição dominante (diz a bíblia que Eva tem de obedecer e servir a Adão), o senhor “Núcleo Duro” decide chamar o representante eleito do seu partido, já sentado por entre os outros representantes. E não é que, esse representante é o seu filho? Engraçado não é? Coincidência? É que numa democracia não há sucessão dinástica, ao que dizem.

Então, lá vem o filho do casal (pois o pai é que tinha consumado o casamento, pois, afinal, também é eleito cessante mas não cessado da anterior assembleia de freguesia que acabava ali as suas funções) chamado pelo papá, e recebe a instrução final: - Vota sim, que já tens lugar no executivo, prometido pelo presidente cessante mas não cessado!

Bem, se algum dia tiver dúvida do que é uma expressão de alívio, lembre-se ou imagine a expressão que terá manifestado este filho, que finalmente conseguiu aliviar-se de toda a tormenta que lhe tolhia os intestinos e para qual já tinha o rolo de papel à espera. Vejam agora, o que vai ser de desenrolar de papel higiénico naquele executivo!

Então o fulano que tinha pedido para votar contra, agora vai votar a favor, uma parca meia hora depois? Bem, é verdade que meia hora é pouco tempo para a resolução de uma desavença conjugal, mas é muito tempo para a resolução de um problema de trânsito intestinal.

Então, por verborreias e diarreias, lá foi votado o executivo e com a abstenção de um dos partidos que tinha eleito só um representante, lá passou o novo executivo, constituído pelos novos membros mais os membros cessantes e não cessados.

A verdade é que depois de queixas à PJ por desvios de verbas dos cofres da junta, o partido que as desviou lá continua com o seu novo presidente, com o seu velho presidente, com o seu novo executivo, com o seu velho executivo (aquele que não tiveram lata de fazer aparecer nas listas eleitorais) e com todas as intenções futuras, previstas em papel de propaganda, mas não concretizadas nem concretizáveis nas cabeças propagandeadas e propagandeadoras. Enfim, é o velho desfasamento entre a promessa e o que é realizado, tal como em qualquer casamento, o noivo nunca é à medida, ou em qualquer problema de trânsito intestinal, o que sai, não é de perto nem de longe, correspondente ao tamanho daquilo que a vítima desejaria ter saído.

Cheira mal esta política? Pois cheira. Mas isto é numa junta de freguesia, agora vejam numa câmara, num governo. O mal, é que muitos dos nossos políticos são extremamente coerentes nas suas acções, fazem na política o mesmo que sempre fizeram na sua…casa de banho!

Já agora, a título de informação, a coligação era entre o PSD e o CDS, os outros partidos eram o PS, CDU e BE. Se calhar, nem todas as sanitas são receptáculo do mesmo tipo de material!

Hugo Dionísio
Praticamente...nada!



Zé Manel, o mais perfeito exemplar de um antropóide da categoria nacional mais representativa, o Homem Light, ou como diria Saramago, o Homem Duplicado, nas suas diversas verborreias de café, lar ou trabalho, sempre que questionado, até num mero fórum Internet, sobre a sua (In) consciência religiosa, responde sempre:

- Sou Católico, Não Praticante!

É engraçado! Desde o Zé Manel da tasca ao Zé Manel da festa Jet 7, cuja tromba sai escarrapachada na revista “Trombas” ou na “Nova (Indi)gente”, de acordo com o princípio Universal da lei do Mais Fácil, a resposta a esta pergunta é sempre igual, :

- Sou Católico, Não Praticante!

Até custa a crer que ovelhas destas, muitas delas tão tresmalhadas que só se lembram que são do rebanho quando, numa manhã de sobriedade pós crepúsculo festivo, se dão conta de que estão dentro de uma igreja, numa qualquer festinha de casamento, baptizado ou funeral, onde são capazes até de largar uma lágrima ou duas, se auto denominem de Católicos, com toda a sua muito limpinha, brilhante e assinada lãzinha.

Claro que se calhar não são só Católicos Praticantes. Se calhar, se formos bem a ver, são apenas…Praticamente Não Católicos! Digamos que, para que toda a gente possa pertencer ao rebanho de carneirada que age por reflexo condicionado, a igreja católica decidiu criar duas categorias de ovelhas:

  • Os católicos praticantes, ou seja, os Beatos
  • Os católicos não praticantes, ou seja, os católicos light ou os Praticamente Não Católicos.

Numa era da superficialidade, do faz de conta, do diz que disse e do que parece mas não é, até deus parece que existe. Para todos os querem parecer bem, agradáveis à vista, dá um jeitaço haver uma categoria de Católicos Light. Se até há chocolate light! E manteiga light! Porque não um Católico light? Afinal, Católico Não Praticante é isso mesmo, é Na Prática Não Se Ser Católico. Uma espécie de “Sou Católico, Mas Na Prática Não Sou” ou melhor ainda “Sou Católico Mas Não Sou”. Contradição? Nem por isso. Tudo o que parece ser…não o é. Aparentemente uma regra, com algumas aparentes excepções, mas mesmo assim, pelo menos, aparentemente, uma regra.

Já viram se a igreja não tivesse uma versão Católico Light, uma espécie de Aparentemente Católico? O que seria dela? A regra Católica é tão dura que não sobraria nenhum, nem o Papa se safava. Pelo menos é o que parece, quando vemos o estado da Igreja Católica e dos seus ministros.

Zé Manel da Tasca, o Católico não praticante, de dia católico, à noite ateu, dos mais ateu que se pode ser, teria de prescindir do seu vinho diário, da porrada na Maria, da fuga aos impostos, da Inveja do vizinho do lado, do gosto desmesurado por tudo o que envolve dinheiro, do consumismo, da conivência com a injustiça, da cobardia no trabalho… A sua Maria teria de prescindir da novela com cenas quase pornográficas, das cusquices sobre a vida alheia…Os dois teriam de prescindir das aparências, das ilusões, da inveja e da língua também.

Já o Zé Manel do Jet 7, incluindo aqueles Zés Manueis que tudo fazem para vir a pertencer a este Jet 7, ou pelo menos, que tentam fazer parecer que pertencem ao Jet 7, teria de prescindir da superficialidade da sua vida em detrimento de um conceito mais espiritual, mais esotérico, ou…alegadamente, mais cristão. Teriam de prescindir da cultura do corpo, para passar à cultura do espírito. Teriam de prescindir do consumismo compulsivo, das festas regadas a álcool e parece que a açúcar branquinho, a prescindir do mixing sexual, das mentiras, dos bicos de pés, da inveja, do gosto desmesurado por tudo o que envolve dinheiro, das novelas com cenas quase pornográficas, da palmadinha nas costas… As Marias também teriam de prescindir disto tudo, mais da cusquice (os Zés do Jet 7 também) e de outras coisas sem fim que, aparentemente, de cristão e católico nada têm.

Já perceberam? Ser Católico Light é poder fazer isto tudo e muito mais. Pode roubar-se, matar-se, violar-se, mentir-se, burlar-se, defraudar-se, tudo está ao alcance de um Católico Light. Basta olhar para os nossos conterrâneos católicos (se calhar não estão lá muito católicos). Desde a Tasca ao T-club, passando por aquelas casas de maus hábitos que são o Palácio de S.Bento e da Ajuda. Nestes, os Light misturam-se com os Hard e vejam o que sai de lá. Alegadamente, uma grande hipocrisia, cinismo, corrupção, Tráfico de influências, Lavagem de dinheiro, peculatos e outros actos de correspondência quantitativamente quase perfeita, em termos éticos, à crença que dizem possuir por deus, por Cristo e pelo espírito santo.

Se Católico Light é não ter de fazer Jejuns (Já não há Jejuns na Igreja Católica? Mas havia). Jejuns? Agora basta não comer carne de animal terrestre na 6ª feira Santa. Ser Católico Light é não ter de viver em função do espírito e fazê-lo em função corpo e da matéria (principalmente do vil metal). Aparentemente até ainda temos a a bula das indulgências. Basta dar dinheiro à Igreja e praticar a caridadezinha. Ser Católico Light é não ter de fazer sexo apenas para procriar (já não é assim? Basta só não usar preservativo). É não ter de ir à missa ao domingo etc. Aparentemente, desde que se reze, penitencie e confesse, podemos prescindir de qualquer plano ético de sobrevivência. É pecado? Não interessa, aparentemente, basta o arrependimento De facto, que Deuzinho tão bom!

Mas há mais. Um católico light até pode, quando está com os copos, emitir grunhidos satânicos e sacrilégios diversos. Pode até ser pedófilo (Ai, os católicos Hard também?). Podem explorar o próximo, desde que seja para obter lucro etc. As Santas casas da misericórdia, as Legiões, As boas vontades, estão cá par ajudar com a cardidade, a limpar o lixo para debaixo da cama. Afinal, basta parecer que se está limpo, porque arrependendo-se, até deus se engana.

Espera aí, estou a constatar que a própria Igreja Católica é uma Igreja Light quanto baste para se poder dizer…sou católico não praticante! Como é que alguém pode ser algo que na prática não é? Se calhar a Igreja Católica é que é light e os católicos não praticantes, são…Católicos Diet. Ou Católicos Slim, ou Mini-Católicos. Uma espécie de Meia ovelha, meio lobo.

Afinal, tudo isto não importa, porque seja que tipo de católico for, do Light ao Diet, afinal só tem de se arrepender. Se se arrepender, deus perdoa, se não deus não perdoa. Ou seja, podemos cometer toda a espécie de barbáries, podemos mesmo renunciar à nossa humanidade e à nossa consciência (aliás, todos os dias ouvimos as ovelhas dizerem: - Que Inconsciência!), porque no fim, basta, em consciência, arrependermo-nos. Estamos perdoados e vamos para o céu.

Ora porra! O que ando eu aqui a fazer com problemas de consciência? Respeitar o próximo, ajudar o próximo? Vou mas é ser Católico Light, Diet, Mini ou seja o que for, pois tudo será mais fácil, a consciência dos meus actos nem precisa de ser a minha. Basta a consciência de Deus, é ele que me perdoa no fim. O peso de consciência é Dele. Que jeito que isto dá a tanta gente. POR isso há tanta Inconsciência. Ah! Portugal, depois de tudo, afinal…basta o arrependimento.

Viva a era do Light, até já há religião Light para pessoas Light.


Hugo Dionísio


Ilusões de invisibilidade


Laureni Santori, famosíssimo estilista da moda mundial, reconhecido pela sua “fineza” estética (e corporal) é o patrão da associação mundial das empresas de moda. Este senhor, amante do bonito e do belo, duas das qualidades imprescindíveis para quem anda nestas lides (embora muitas vezes não se saiba bem a que bonito e belo de referem) é o responsável pela sobrevivência e expansão da indústria da moda.

A indústria da moda, como indústria da aparência é também a indústria da ilusão. A ilusão de que qualquer um pode chegar aos estereótipos criados e difundidos. Alguns, só por via da ilusão de óptica, é verdade, pois a sua aparência não lhe permite outro tipo de ilusão mais materializável, mas mesmo assim, também têm o direito a acreditar de que um dia, com muitíssimo esforço, farão parte desse mundo de hologramas e efeitos de photoshop, que é o mundo da moda.

Um desses estereótipos, mais difundidos por Laureni Santori, é o da magreza extrema. As modelos e os modelos são cada vez mais magros, aliás, qualquer dia, quem ficar de lado nos desfiles, não vê os manequins, mas isso é um pormenor muito pequeno, em função do pormaior que levou Laureni Santori a querer difundir (ao contrário da moda dos anos 20 e 30 que difundia a ideia de mulher redondinha, trigueirazinha, forradinha…Aí que saudades desse tempo!) a ideia de magreza em que assenta a ilusão da moda actual.

E que pormaior é esse? Pois é, já pensaram em quem ganha com essa ideia de magreza extrema? Vamos fazer a lista:

• Os psicólogos e pedopsicólogos, ao tratarem os jovens e adultos com problemas de anorexia e bulimia. Se o estereótipo apontasse para pessoas mais “normais”, já viram o dinheiro que o estado poupava em Saúde Mental? E as pessoas andariam muito mais satisfeitas, não?

As conversas das mulheres em vez de – Então Maria, já se nota um pneuzinho, tens de emagrecer. Seriam – Então Maria, não tens pneuzinho nenhum? Tens de engordar! (até a agricultura e a industria alimentar se desenvolviam mais). Ou ainda: - Então Maria, a gravidez deixa marcas, não é? Ainda vais levar tempo a voltar ao lugar! E em vez disso: - Então Maria, a gravidez fez-te muito bem! Está mais bonita! (até a natalidade subia, o que era bom para contrariar o envelhecimento da população).

• Os investidores em Centros de plásticas e estética corporal. Quem quereria bandas gástricas e lipoaspirações? Em vez disso, far-se-iam “extensões gástricas” e “lipointroduções” para os mais magrinhos.

• Os investidores em ginásios, spas e health centers. Não haveria lugar para vícios do desporto e da actividade física extrema. O desporto voltaria a ser visto como algo de saudável e com vista ao desenvolvimento humano e não como um caminho sem fim para a magreza extrema.

As conversas seriam: - Então, foste ao ginásio hoje? Vê lá se não voltas lá amanhã! Tanto ginásio põe-te fora de forma!

• Os empresários de pastilhas e comprimidos dietéticos. Quem os tomaria? Voltariam os tempos em que se iria à farmácia pedir umas vitaminas porque se andava sem apetite. Hoje em dia, a maioria das pessoas, quando não têm apetite, saltam de contentes.

• Os empresários de comida light. Quem pediria um queijo da serra light? Ou uma compota light? Ou um pacote de leite com chocolate light? Ou um chouriço light? Em vez disso, a industria alimentar tradicional seria o orgulho da nação, sem preconceitos e sem terem de viver com a consciência pesada de ter de enganar o público em geral, tendo de chamar light a coisas que de light nada têm.

• Os nutricionistas e outros. Quem iria ao nutricionista? Só quem queria engordar.

• Os fabricantes de cremes para criar a ilusão de que se emagrece. As pessoas compram esses cremes, colocam-nos todos os dias, várias vezes ao dia e até aprece que fazem efeito, porque basta ter a ilusão que fazem.

• Os fabricantes de espelhos em que as pessoas parecem mais magras.

Pois é, vou registar a patente de um espelho destes, afinal, num mundo de ilusões tanto faz ser magro, como parecer magro. Não?

Agora vejam, como Laureni Santori merece o Nobel da economia. Já viram que indústria da magreza existe por causa do seu estereótipo? Até custa a crer que alguém tenha pensado nisto não?

Laureni Santori não existe…ou talvez sim...

Hugo Dionísio