Estes
senhores querem tornar-nos a vida como um jogo de computador. Desafios, obstáculos
e barreiras permanentes. Querem tornar-nos animais com instintos de sobrevivência
exacerbados e desprovidos de capacidade crítica. Como num jogo de computador,
agimos muito e pensamos muito pouco.
O
ataque à contratação colectiva, a lei dos trabalhadores
“Diminuir
o prazo de vigência é dinamizar”. Isto era o que dizia uma advogada qualquer –
talvez de um dos escritórios que enriquecem à conta do estado – sobre o
projecto que o governo tem de alterar o regime da contratação colectiva de
trabalho.
Cheira-me
que este artigo no jornal O Público foi feito a pedido e, esta senhora, fará
parte de algum grupo, escritório ou seita “civilista” que está na origem das
propostas governamentais para a contratação colectiva de trabalho. Mas, presunções
à parte, é a ideia de flexibilidade propagada por esta sujeita que me causa urticaria.
Segundo
a senhora drª, diminuir o período de vigência das convenções colectivas, ao
contrário de matar, dinamiza a contratação colectiva. Porquê? Porque, nas palavras
da douta jus-laboralista, os patrões não querem negociar contratos colectivos a
que se tenham de amarrar durante vários anos. Assim, se os contratos durarem um
ano ou dois, apenas, haverá mais comércio jurídico nesta área.
Mais
flexibilidade dá jeito às empresas…
Bem,
não deixa de ser verdade que, assumindo que as partes negoceiam, mais contratos
são publicados. Outro ponto a favor desta alteração, referido pela ilustre drª,
é o de que assim as empresas poderão enfrentar melhor os fluxos e refluxos económicos.
Contra factos, não há argumentos!
Contudo,
esta ideia tem em sim mesma uma contradição: A contratação colectiva tem valor
de lei, nas matérias que pode regular; aliás, para os trabalhadores abrangidos
constitui a sua lei laboral. Alguém aceita como racional que uma lei, que se
pretende estável, consolidada e previsível, esteja constantemente em alteração?
Onde fica a segurança jurídica, onde fica o principio da estabilidade temporal
das normas jurídicas?
Leis
que mudam a todo o tempo… São boas para alguém?
Imaginem
leis que mudam a todo o tempo – e muitas mudam -, alguém vê isso como uma coisa
boa? Mesmo que sejam advogados, juízes ou outros?
Nenhum
sistema de normas sobrevive dessa forma. Ninguém contrata colectivamente, com
todas as incidências que um processo negocial possui, para daí a algum tempo
voltar a ter de fazê-lo. Muitos processos negociais duram meses ou anos; nestes
casos, estar-se-ia a negociar um contrato colectivo com uma duração muito limitada
tendo em conta o esforço, temporal e humano, dispendido. Esta ideia é uma falácia.
Não
faz sentido e, como se pode ver, tal alteração à lei constitui a morte da
contratação colectiva e o que me custa é o seguinte: é esta gente não assumir
que estão a destruir a contratação colectiva, como tem sucedido desde que
iniciaram este processo em 2003; é não assumirem que a destruição da contratação
colectiva resulta de uma imposição de Bruxelas e da troika – já em 2009, o
comissário europeu para o emprego referia que era necessário limitar os salários
estipulados nas convenções colectivas; é não assumirem que o objectivo final é
tornar a relação laboral totalmente flexível, de forma a submeter o trabalhador
em toda a extensão da sua personalidade.
A
ideologia da precariedade eterna
Mas
toda esta ideia (ou, ideologia) de flexibilidade continuada, alteração constante,
instabilidade permanente e precariedade intrínseca às relações de trabalho – não
nos esqueçamos que é no trabalho, ou por causa dele, que se dão alguns dos
maiores conflitos das nossas vidas – mesmo que fosse boa para as empresas,
levar-me-ia a colocar sempre uma questão de fundo: desde quando é que alguma
coisa que dificulta a vida às pessoas pode ser boa?
Estes
senhores querem tornar-nos a vida como um jogo de computador. Desafios, obstáculos
e barreiras permanentes. Querem tornar-nos animais com instintos de sobrevivência
exacerbados e desprovidos de capacidade crítica. Como num jogo de computador,
agimos muito e pensamos muito pouco.
As
personagens do jogo somos nós!
Aliás,
a consciência crítica que nasce do conhecimento, só surge com o tempo. Sem o
tempo para pensar, agimos apenas por instinto; agindo por instinto,
sobrevivemos, apenas; sobrevivendo, apenas, não transformamos o mundo porque
deixamos de sonhar.
É
nisto que nos pretendem transformar: em personagens de jogos de acção, que
passam a vida toda a ultrapassar obstáculos sem chegar a lado nenhum. Afinal, o
jogador que comanda a personagem, não quer que o jogo acabe. È nisto que nos
querem transformar, submetendo as nossas vidas às flutuações dos jogadores da
bolsa, da lata finança e dos mercados. Eles jogam, nós agimos. O sonho é deles,
o esforço é nosso!
Pensem
nisto.
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