Martim Albuquerque, cabelo lambido, fatinho azul-escuro, mocassins, camisinha Triple Marfel de colarinho branco, botãozinho de punho de ouro e botões do casaco dourados, é gestor e MBA da empresa de “consultoria” de gestão, PMSERV SA. Claro que Martins há muitos por esses meios de comunicação social de “referência”e por essas empresas de “consultoria” ou “management consulting”. Mas pretensos Martins, infelizmente, ainda há mais. Daqueles que mostram isto tudo mas…não mandam nada.
Estes seres como o Martim, sempre muito estudiosos, Frequentam cursos nos EUA como “Business Strategic Planning”ou “Business Risk Assessment”. Sempre cursos muito ricos e inovadores, onde se aprende muito e se importam soluções inovadoras para problemas iguais. Claro que os pretensos Martins não vão aos EUA, ficam-se por Lisboa e bebem da sabedoria de pessoas como os…Martins, que lhes transmitem soluções sempre muito inovadoras. Há que estar sempre actualizado.
Imaginem que Martim, pela manhã, foi chamado a dar o seu parecer a uma empresa cliente. Esta empresa, confrontada com o decréscimo das vendas do seu produto, decréscimo este, relacionado com a competitividade imposta pela globalização, pediu a Martim que lhe fornecesse uma estratégia para sair da crise. E que solução propõe Martim e tdoso os Martins deste país, deste mundo ou até…deste sistema planetário?
“Perante um cenário tão adverso, imposto pela Globalização, é fundamental que a vossa empresa aposte na Inovação, Qualidade e Excelência do seu produto. Desta forma a solução que proponho é reduzir o custo com o trabalho em 30%, pelo que os senhores têm de despedir 250 “colaboradores”.
Estes Martins e os outros todos são efusivamente aplaudidos, as empresas clientes pagam milhões pelos seus serviços inovadores. Os patrões em dificuldade vão-se embora satisfeitos, afinal a culpa é da globalização e dos trabalhadores e agora…agora é só despedi-los.
Agora imaginem também que o Martim, os Martins todos e os outros, Gestores, Economistas, financeiros e Contabilistas reconhecidos vão, à tarde, a uma entrevista para uma rádio de âmbito nacional. O Jornalista, economista também, perguntou-lhe o que devem as empresas Portuguesas fazer para recuperar da crise, e a resposta, seja que Martim for, é a seguinte:
- As empresas Portuguesas devem acima de tudo, apostar na Qualidade, na Inovação e no alto valor acrescentado dos seus produtos, mas o problema disto tudo é que o Código laboral é muito rígido e não deixa despedir pessoas sempre que o empresário julga ser necessário. È uma maçada, pois só baixando o valor da mão-de-obra é possível dar competitividade às nossas empresas.
O Jornalista da rádio aplaude e regozijando-se com a resposta, pergunta se os despedimentos são necessários para dar competitividade à economia, ao que Martim responde:
- O diagnóstico dos problemas da nossa economia, meu caro, são sobejamente conhecidos, falta formação à nossa mão-de-obra, falta inovação às nossas empresas e falta um enquadramento institucional que permita atribuir competitividade às nossas empresas. Portugal é o país onde as empresas pagam mais impostos. Portugal é um país onde as empresas têm muitos custos com o trabalho pois o Código Laboral é muito rígido, é o mais rígido do mundo. Os “colaboradores” em Portugal têm regalias que já não são comportáveis com uma economia competitiva. Para se conseguir gerar emprego, primeiro tem de se despedir. Ao despedir-se as empresas aumentam a competitividade e a produtividade e assim já podem gerar emprego.
O programa de rádio é um sucesso. Martim, seja qual Martim for, nas palavras do editor, trouxe ao programa um conjunto de ideias modernas e inovadoras, que revelam a sua coragem, pois normalmente ninguém tem a coragem de assumir estas ideias em público.
Imaginem que de seguida, Martim saiu do programa e foi para o seu escritório, tinha ainda de escrever um artigo para uma revista de Economia e Gestão. Um artigo sobre ideias para uma economia de futuro em Portugal.
Martim inicia a redacção do artigo e decide atribuir-lhe o seguinte fio condutor:
“Portugal tem de fazer reformas estruturais. Portugal tem de se colocar ao nível das economias mais desenvolvidas a nível mundial. E o que fazer? Portugal tem de apostar na Qualidade, no Rigor, na Inovação e na Competência. Mas como fazê-lo com um Código Laboral tão rígido? Como podem as empresas fazer face à crise se não puderem despedir e com isso melhorar a sua performance empresarial?”
Martim apresentou o artigo e o Editor da revista congratulou-se com o facto de ter entre mãos um artigo tão inovador. Martim era um grande estudioso, sem dúvida. Um homem que tem soluções e sabe fundamentá-las. Tem soluções diferentes, arrojadas, modernas e corajosas. Martim não é um patrão, Martim é um empresário.
Martim, os outros Martins e os pretensos Martins, estudam muito, muitos anos, para poderem dar sempre, sempre, estas soluções. Não está ao alcance de qualquer um.
No outro dia de manhã, Martim tinha mais uma empresa a pedir-lhe o seu conselho. Afinal já não se sabe como começou o seu sucesso. Nas rádios, revistas ou TV’s onde participa ou nas empresas para as quais dá as suas soluções inovadoras.
A empresa em causa perguntava-lhe o que fazer perante um cenário em que estava a perder quota de mercado devido aos produtos da concorrente serem mais baratos e de melhor qualidade, aliados a um política de imagem mais eficaz. Mais um caso para aguçar a perspicácia e conhecimento científico de Martim.
- Meus caros, após um Business Risck Assessment à vossa empresa, dei conta de que Vºs Exªs possuem um capital humano ultrapassado e uma forma de o gerir bastante arcaica. Têm de melhorar o vosso produto, do ponto de vista da qualidade, imagem e preço e para isso precisam de competência, rigor e inovação. Assim, proponho-vos desde já o despedimento de 500 “colaboradores” e a instituição de prémios de produtividade para ver se aumentamos a produtividade sem aumentarmos os custos com o trabalho, já de si elevados.
Martim cobra 10 mil euros pelo serviço. Martim representa o alto custo da Mão-de-obra em Portugal. Mas Martim é mais do que isso:
Martim é um estudioso com soluções inovadoras, Martim tem sempre soluções iguais para perguntas diferentes. É muito saber. É muita modernidade. É muito à frente.
Martim, os outros Martins e os pretensos Martins são o “Desempregador Implacável”.
Quem nos acode?
Nota: Definição de Martim – pessoa liberal, neo-liberal, economista, gestor, financeiro ou contabilista, de personalidade autista, que se considera o dono da verdade e que mostra um desprezo enorme pelos “lambões” dos “colaboradores” que só querem direitos e não deveres. Martim, personificado em seres como Camilo Lourenço e outros economistas comentadores da nossa praça, são daqueles que estudam muitos anos mas a solução é sempre a mesma, mais despedimentos.
Ver também sucedâneo de Martim- Pessoa vendida que quer ser Martim mas por infortúnio da vida não o é. Leva com a lavagem na Universidade e quando sai cá para fora ainda é mais implacável que os Martins. Quando toca ao despedimento é, normalmente, o último a ser despedido pois os Martins utilizam-no para o trabalho sujo.
1 comentários:
Pois, o despedimento ou a reducao de custos. Depois o out sourcing e os recibos verdes. Mas para mim, o que devia acontecer e ja era o despedimento colectivo de todos os trabalhadores. Tudo para a rua sem apelo nem agravo. Os Martins aplaudiam a inovadora resenha economica, uma experiencia sem duvida, um factor de futuro, capaz de alterar o rumo da economia. Depois as agencias e as outsourcing iniciavam a grande estrutura de mudanca no pais, com a mao de obra mais barata do mundo. O codigo de trabalho deixava de existir. Que feliz seria este pais.
E horrivel mas e verdade.
O teu Martin e o homem duplicado, mas e somente um espaco no imenso oceano de tubaroes que por ai andam. E ve-los todos os dias por ai, deambulando a procura da presa...
Um abraco hugo.
Enviar um comentário